«EU PECADOR, ME CONFESSO»

Geralmente dividimos as pessoas em dois grupos: santos e pecadores. É uma divisão imaginária. Para começar, ninguém sabe realmente quais são os santos e quais os pecadores. As aparências enganam. Além disso, todos nós, pecadores e santos, somos pecadores.

Um padre, certo dia, perguntava a um grupo de crianças, numa turma:

– Se os homens bons, no mundo, fossem brancos e fossem negras as pessoas más, vocês, que estão aqui, que cor teriam?

E a pequena Maria respondeu:

-Acho que eu seria às riscas…

Listrado seria também o Reverendo da pergunta; listrados os Mahatmas, os Papas e todos os santos canonizados.

«Certo homem procurava uma igreja para rezar e, na que encontrou, o pregador orava com o seu povo. E diziam eles, mais ou menos assim: “Deixámos de fazer aquelas coisas que era nosso dever realizar; ao contrário, fizemos muitas coisas, que jamais devíamos ter feito”.

Ouvindo isto, aquele homem suspirou e, com grande alívio, disse para consigo: “encontrei, finalmente, o meu lugar!”

Às vezes, notam-se esforços para esconder a natureza “listrada” dos nossos “santos”. Tais esforços, de vez em quando, podem ser bem sucedidos, mas são sempre desonestos!» (Anthony de Mello, O Canto do Pássaro, Edições Paulinas, 1995 – páginas 148-149.

Quando hoje se fala de pecados, a reação é, o mais das vezes, um sorriso sarcástico, quando não uma atitude agressiva ou anticlerical. O pecado ter passado de moda… No entanto, quando a gente fala da fome no mundo, das guerras, do comércio de armas, da droga, da corrupção, do trabalho infantil, da exploração dos idosos, da prostituição, do aumento da criminalidade, do abuso sexual das crianças… é possível que a agressividade se mitigue, embora se diga, apesar de tudo: isso não acontece comigo nem com a minha família…

O maior pecado do homem, de modo particular dos cristãos, nem é a prática do mal, mas a omissão do bem. A perfeição cristã não consiste na ausência do mal, mas na prática do bem: «Sede perfeitos, como o vosso Pai celeste é perfeito» (Mt 5,47). O maior pecado do homem é a recusa da conversão ao bem: o poder mudar de vida, a cada momento, e não o fazer. Foi este o tema da primeira pregação de Jesus: «Completou-se o tempo e o Reino de Deus está perto; arrependei-vos e acreditai na Boa Nova! (Mc 1,15).

Por causa dos nossos pecados, veio Jesus Cristo à Terra, para que, pela sua morte e ressurreição, nos elevasse à dignidade de filhos de seu Pai, dignidade que tínhamos perdido pelo pecado original: «Ó feliz culpa, que tão grande Redentor mereceu ter!» – canta a Igreja, todos os anos, na noite da Vigília Pascal.

Os cristãos não se deviam envergonhar de ser pecadores, porque como diz a Bíblia: «sete vezes peca o justo e se torna a levantar» (Prov 24,16)… E peca, não por ser mau, mas por procurar o bem…

Os cristãos têm, como toda a gente, todas as razões para pecar, e mais uma: a de serem cristãos. O seu amor a Jesus Cristo leva-os a viver numa insatisfação espiritual constante, e a revoltar-se interiormente consigo mesmo, com o mundo e o mal do mundo.

Por mim, prefiro, ao fim de cada dia, ter motivos para pedir perdão a Deus pelos pecados cometidos pelo desejo de fazer o bem (falta de paciência, arrelias, irritações, agressividade…). É que isso dá-me melhor consciência do que a «boa» consciência de não ter praticado o mal: «o justo peca sete vezes» (Prov 24,16), por ser justo. Ninguém tem que se envergonhar de ter que pedir perdão a Deus pelos pecados cometidos «por causa da justiça». De outro modo, Cristo não nos teria ensinado a pedir, com tanta insistência: «Perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido! Não nos deixeis cair em tentação; mas livrai-nos do mal! (Pai Nosso).

Nunca foi o pecado que escandalizou Jesus Cristo. Muito pelo contrário. Teve sempre um coração aberto para os pecadores arrependidos. Mas nunca o teve para os fariseus hipócritas, que se gabavam de não ter pecados, ao contrário dos publicanos arrependidos (Lc 18,9,14).

Se fôssemos mais humildes – mais cristãos – não teríamos vergonha do que faz a nossa grandeza: sermos filhos de Deus, apesar dos nossos pecados!

Se fôssemos mais humildes – mais cristãos – trabalharíamos mais pela nossa perfeição e pela perfeição dos outros, mesmo que isso nos pudesse levar a cometer mais pecados do que os que apenas se contentam em não praticar o mal!

Se fôssemos mais humildes – mais cristãos – viveríamos naturalmente num mundo melhor, porque trabalharíamos mais por tornar o pequeno mundo em que nos movemos, mais humano e mais divino, ainda que, para isso, tivéssemos que nos arreliar mais do que os que se contentam com não ter problemas com nada nem com ninguém!

Se fôssemos mais humildes – mais cristãos – viveríamos numa insatisfação constante com os nossos males e com o mal do mundo; trabalharíamos mais por deixar o mundo melhor do que o encontrámos, ainda que, para isso, tivéssemos mais razões para rezar por termos pecado por «amor da justiça» do que as têm outros por falta de pecados, por «medo das injustiças»!

Se fôssemos mais humildes – mais cristãos – seríamos capazes de viver e conviver com os próprios pecados e com os pecados dos outros, ainda que tivéssemos que rezar mais por nós e pelos outros!

Se fôssemos mais humildes – mais cristãos – acreditaríamos mais no mistério da Redenção, ou seja: que Deus, por nosso amor, encarnou, morreu e ressuscitou para a todos salvar: «Deus perdoou-nos todas as nossas faltas, anulando o documento em que elas estavam inscritas… Deus suprimiu esse documento, cravando-O na cruz» (Col 2,14).

Perante tudo isto, quem terá vergonha e medo de se confessar pecador, se «há mais alegria no Céu por um só pecador que se arrepende do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento?» (Lc 5,7). Eu, por mim, pecador me confesso!…

 

Autor

Pe. Domingo Monteiro da Costa, S.J.

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