O Menino foi passear?

Olhando o tempo que, por graça, nos é dado viver; olhando como quem escava, com a paciência e a resiliência dos semeadores, imersos ainda neste grave e perturbador flagelo da Pandemia que assola todo o mundo, lutando com esse inimigo invisível chamado Covid-19 e numa profunda crise sanitária nunca antes vivida; tempo de profundas transformações humanas e sociais, políticas e económicas, sobressaltados pelo medo e pela desconfiança, frágeis e vazios, numa penitência imposta e arrebatadora onde se semeia a ausência de rostos, de afetos e de sorrisos, muitos dos nossos contemporâneos talvez se perguntem na proximidade do Natal, angustiosamente: o Menino foi passear?

E é em Advento que estamos. Advento que marca a nossa condição no mundo. Sempre seremos criaturas à espera, habitados mas incompletos. Reflorescendo e vulneráveis, em visitação e sós. Mas este é o tempo para uma piedosa e alegre expetativa. Tempo para refundarmos a casa, cuidarmos do coração, nos adentrarmos no mistério espantoso da Vida. Buscadores e cultivadores de uma profunda e fecunda intimidade espiritual que nos abra ao desejo das alturas, d’Aquele que rasga os Céus e desce à nossa vida como um Filho, um Menino, o Emanuel, Deus connosco e para nós. Tempo para aprendermos a amar os bens do Céu. Mas ainda acreditamos no Céu? Ainda tem sentido esperar por Ele? O que é o Céu na nossa vida tão mergulhada no materialismo e no relativismo? Não precisaremos de uma piedade que nos faça mergulhar no amor das coisas divinas? Na certeza que Deus vem? É vizinho e próximo e em Cristo está sempre presente connosco e para nós?

É agora, neste tempo que Deus nos fala. Assim o celebramos na Liturgia da Igreja, trazendo ao tempo da celebração da fé onde levamos as nossas vidas inquietas, inseguras e frágeis toda a História da salvação, prolongando-a em Páscoa nas nossas próprias vidas, convidando-nos a escrever um futuro aberto à Esperança.

É neste Tempo, que vamos rezando como, na verdade, acreditamos: Que com vontade firme nos saibamos preparar pela prática das boas obras para ir ao encontro de Cristo. Que obras deseja nosso coração? Que obras, efetivamente, realizamos? Este Tempo é Tempo de Cristo. Não estamos sós. Sabemos a fonte e o sentido da vida e da História, do mundo e do Tempo. Precisamos da fortaleza da fé, da fecundidade do amor para destruirmos as noites e os obstáculos que nos impedem a vida e a felicidade. Mas conhecemos a Criança do Natal?

Pedimos que os cuidados deste mundo não sejam obstáculo para caminharmos generosamente ao encontro de Cristo. Onde repousamos o coração? Que inquietações pululam nossa consciência? Este é o Tempo do Espírito Santo, que nos unge no amor e na luz para aprendermos a saber ler os sinais dos tempos, a não negar a realidade das coisas, a não nos apoiarmos nas falsas seguranças e certezas, a não confinarmos as buscas e a verdade, a sermos possuidores de um espírito vigilante seguindo sempre os ensinamentos do Salvador, caminhando ao seu encontro com as lâmpadas da fé acesas.

Para que aconteça Natal e seja renovador o nosso Advento desejamos saber celebrar com renovada alegria as solenidades da nossa salvação.

Nós que já conhecemos a encarnação de Cristo, pela sua paixão e morte na cruz queremos viver para alcançar a glória da Ressurreição. A Encarnação e a Páscoa são vindas de Deus à nossa vida que a celebração da Eucaristia torna particularmente presente no Sacramento. Que novidade manifesta a nossa vida?

Sabemos: o Menino não foi passear! Ele vem como Senhor! Cada dia. Em cada Tempo. Ele vem destruir todos os senhorios que não nos deixam ser plenamente livres e felizes. Vem trazer luz às nossas trevas, trazer o divino à nossa humanidade ferida e cansada.

Neste Natal, precisamos saber olhar a Criança, olhar como quem escava, com a paciência e a resiliência dos semeadores. Precisamos ler o presente para saber escrever o futuro, acolhendo a visita do Menino, que em cada Natal vem trazer sempre Deus às nossas vidas. Precisamos de Deus, porque somos de Deus. E precisamos neste Tempo saber esperar como a Mãe, a Mulher, a feliz porque acreditando, deixou o Senhor habitar a sua casa, a casa do seu coração. É neste Tempo e neste mundo que o Senhor está. Não sentes o seu olhar e a sua mão, convidando-te a passear com Ele?

Fonte: https://agencia.ecclesia.pt

Autor: Padre Carlos Aquino, Diocese do Algarve

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