O arminho no retiro

O pregador do retiro procurou entusiasmar-nos. Com dezenas de exemplos, incentivou-nos à santidade. Numa das meditações falou do arminho.

Não sei se o pregador sabia que a pelagem do pequeno carnívoro varia de acordo com a estação do ano. Mas, se sabia, na meditação que ouvi situou-se apenas na cor dominante no outono e no inverno: o branco; branco com uma única reserva – a ponta da cauda, sempre negra, em qualquer ocasião.

Entusiasmado, o pregador disse-nos que o arminho tinha tal estima pela alvura, que os caçadores adotavam uma estratégia: iam-no encurralando para um local pantanoso, em cuja margem o animal se detinha, preferindo ser morto a fugir através da lama. Deste modo era facilmente capturado.

Percebi o intuito do pregador; mas confesso que nunca tentei (des)confirmar a veracidade do seu “exemplo”. Ainda hoje, isso pouco me incomoda – porque o que realmente me preocupa não é o comportamento do arminho, mas o de pessoas concretas, que pensam viver de mãos limpas, quando as guardam nos bolsos. Mais: ao menos, o bom do animal joga a sua própria pele; ao passo que a gente das mãos nos bolsos implica e compromete, normalmente, a vida dos outros…Sei que o faz com muito equilíbrio e proclamada sensatez, repetindo mil e uma vezes, que “a virtude está no meio”; no eixo da via – diria eu. Mas o facto é que não me parece que esteja. Apetece-me mesmo dizer que a virtude está nas margens e nas valetas, porque é lá que estão os desprezados, nus, famintos ou sedentos: aqueles com quem Deus se identifica!..

Sim; acredito seriamente que santidade e a mudança das situações de injustiça não se conquistam por fuga ou afastamento, mas por aproximação e proximidade! Di-lo, com meridiana clareza D. José Traquina, na Mensagem para a Semana da Cáritas publicada algures neste semanário: “Numa homilia, Martin Luther King, acerca da parábola do Bom Samaritano (Lc. 10, 25-37), afirma que o sacerdote e o levita terão pensado: ‘o que será de mim se me aproximar dele’?; ao passo que o samaritano terá pensado: ‘O que será daquele homem se eu não me aproximar?’”.

Olhando para dentro de si mesmos, totalmente concentrados, o sacerdote e o levita preveniram-se da impureza legal – não percebendo que Deus tinha saído do templo para onde corriam e tinha vindo esperá-los na estrada.

Este continua a ser, ainda hoje, o nosso pecado mais frequente: não perceber que é no outro e com o outro e as suas circunstâncias que verdadeiramente amamos a Deus. Ele nos há-de explicar isto mesmo quando Lhe perguntarmos: “Senhor, quando é que Te vimos….?”

João Aguiar Campos,

Secretariado Nacional das Comunicações Sociais

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