14 de fevereiro de 2016 – 1º Domingo da Quaresma – Ano C

Iniciámos na Quarta-feira última, com o rito penitencial da imposição das Cinzas o Tempo da Quaresma.

A Igreja propõe-nos, neste tempo forte da Liturgia, uma caminhada que nos levará até à Páscoa da Ressurreição do Senhor. É um espaço de luta ascética em que vamos preparar o Batismo ou — se já o recebemos — renovar as suas graças por uma profunda conversão pessoal. Contamos, para esta renovação interior, com a ajuda imprescindível da Graça de Deus.

O amor de Deus para connosco pede-nos correspondência

Moisés ensina ao Povo de Deus a fórmula da apresentação dos dons ao Senhor. Nela se resumem as verdades fundamentais da fé que devemos professar.

Eleitos de Deus. A eleição dos Patriarcas recorda-nos a eleição que o Senhor fez de cada um de nós, ao chamar-nos à Igreja, pelo Baptismo. Para aqueles que o receberam, foi o acontecimento mais importante da sua vida; para os que o preparam será também um passo inesquecível.

Talvez nos habituemos demasiado a esta eleição que o Senhor fez de nós e a sua riqueza se vá apagando aos nossos olhos.

O Tempo da Quaresma é um espaço propício para avivarmos em nós a recordação desta verdade: somos eleitos de Deus para a felicidade eterna.

É uma felicidade cristãos, membros da Igreja, quando aceitamos viver generosamente as exigências desta vida.

Quantas vezes ao dia me lembro de agradecer a filiação divina e a felicidade inimaginável a que o Senhor me chamou, sem merecimento algum da minha parte?

Da escravidão para a liberdade. A permanência no Egipto e o Êxodo evoca a escravidão que o pecado, a tibieza e a mediocridade de vida causam em nós e o desânimo em que tantas vezes nos deixamos apanhar

E como Deus nunca desiste de nos salvar, seja qual for a situação em que nos encontrarmos, Ele vem ao nosso encontro com solicitude, vindo em nosso auxiliando-nos com a luz da Sua palavra e a ajuda imprescindível dos Sacramentos.

O Senhor levantou-nos da humilhação a que o pecado nos reduziu; e nós regressamos a ela com uma teimosia infantil, sem atentarmos nos riscos em que ela nos coloca.

Por isso, a Igreja faz da Quaresma um verdadeiro espaço catecumenal em que as pessoas são instadas a preparar intensamente o baptismo, ou a renovar as suas promessas na noite da Vigília Pascal.

Estou convencido de que o pecado é uma verdadeira escravidão que, com a sua repetição ou permanência nele, vai criando uma teia de cada vez mais forte que me imobiliza na caminhada para a liberdade?

A vida nossa tem um sentido. A doação da Terra Prometida lembra-nos que a nossa vida tem um sentido: vamos a caminho do Céu, porque o Senhor conduz-nos – contando com o nosso esforço – a viver, na terra, a alegria dos filhos de Deus; e a participar eternamente no Céu da comunhão feliz com a Santíssima Trindade e com todos os bem-aventurados.

Nunca podemos perder de vista este ponto de referência para a nossa vida: a Pátria onde viveremos eternamente é o Céu. Se não chegássemos até lá, a nossa vida seria o maior dos fracassos.

Mais do que a oferta dos frutos da terra – aludidos na primeira leitura – o Senhor pede-nos a oferta do nosso coração, sem qualquer reserva ou limite de tempo.

São estas as disposições fundamentais com que a Igreja nos convida a percorrer os caminhos desta Quaresma.

Com toda a sinceridade com que devo apresentar-me diante do Senhor, estou interiormente disponível para me converter? Reconheço, com toda a sinceridade, que tenho urgente necessidade de o fazer?

A luta interior

Deus pede-nos um esforço responsável de fidelidade, de mãos dadas com Ele, para que tenhamos merecimento e recompensa. Sem responsabilidade não há liberdade, e sem esta, não há merecimento. São três aspectos inseparáveis da minha caminhada na terra.

A proposta da Liturgia da Palavra deste Domingo é a luta contra as tentações, no seguimento do exemplo de Cristo. «Jesus, (…) Foi conduzido pelo Espírito Santo através do deserto e tentado pelo demónio durante quarenta dias

A tentação, uma prova a vencer. Em si mesma, a tentação não é um mal, nem um bem. É como uma competição desportiva em que nos apresentamos com o desejo de a ganhar.

Não deixa de ser curioso notar que Jesus foi conduzido pelo Espírito Santo ao deserto onde foi tentado.

Outra nota a ter em conta, é que Jesus é tentado depois de ter estado a fazer uma coisa boa: a orar e a jejuar durante quarenta dias.

Muitas pessoas teimam em ver nas tentações com que são provadas um sinal do desagrado de Deus em relação a elas. Nada mais errado. Ele permite a provação para que tenhamos oportunidade de Lhe manifestarmos o nosso amor fiel.

Algumas tentações têm origem na nossa fragilidade pessoal, acentuada pela inclinação doentia para a desordem moral: na preguiça e recusa de qualquer esforço, na sensualidade e na gula, ou na cultura orgulhosa da própria glória. As tentações de Jesus não podiam ter esta origem, porque a Sua natureza não estava desequilibrada como a nossa, por causa do pecado original.

Outras, vêm do demónio, quer directamente, pelas suas sugestões, quer porque se serve das pessoas com quem vivemos para nos dar maus exemplos e nos aliciar a segui-los. No caso de Jesus – como se declara no Evangelho –, a tentação veio do demónio que resolveu, pessoalmente, experimentá-l’O: Ele não saberia que estava na presença do Messias.

É uma dolorosa realidade que podemos constatar a cada momento: a organização do mal, como a imoralidade, a morte criminosa, o ódio, têm um inspirador, um dirigente desta orquestra da iniquidade.

Os três rostos de tentação. Nas três propostas que o Inimigo do homem faz a Jesus estão resumidas todas as tentações com que somos provados.

– «Disse-Lhe o Demónio: ‘Se és o filho de Deus, diz a esta pedra que se transforme em pão’.» À primeira vista, encontramos uma certa lógica nesta proposta: «Nesses dias, (Jesus) não comeu nada e, quando eles terminaram, sentiu fome». Era, pois, natural, que procurasse alimentar-Se.

Mas a proposta que o Inimigo Lhe faz é, nem mais nem menos, que usar o Seu poder divino ao serviço das coisas materiais.

Não falta quem deseje ver a Igreja que Ele fundou empenhada num projecto político, misturando os dois mundos – como acontece no fundamentalismo islâmico e noutros credos.

Também na Igreja há quem se envolva a tempo inteiro em projectos de trabalho, de iniciativas sociais, e não guarde tempo para a oração e sacramentos.

É igualmente a doença de algumas famílias de hoje: os pais empenham-se a tal ponto nas preocupações económicas que não encontram tempo para educar os filhos nas virtudes humanas e transmitir-lhes a fé.

Estamos perante a cedência à concupiscência dos olhos, à ambição do ter mais, ocupando o lugar do ser mais. A resposta é-nos ensinada por Jesus: «nem só de pão vive o homem».

– «Dar-te-ei todo este, e a glória destes reinos, porque me foram confiados». Qual a condição para usufruir de tanta liberalidade? «Se Te prostrares, para me adorar, todo esse poder será teu

Ela uma tentação falaciosa: em vez de um trabalho cansativo de evangelização, com um prodígio destes, toda a gente se converteria, e os reinos ficavam a fazer parte do Reino que Jesus vinha fundar.

Esta sugestão diabólica envolve, mais uma vez, algo reprovável: o abuso da liberdade das pessoas. Tem a sua versão actual na falta de liberdade religiosa, em muitos lugares e modos. Acontece até que, a pretexto de liberdade neste campo, se priva as pessoas dela, proibindo ou dificultando o ensino religioso nas escolas, apelando para ela, como se qualquer religião fosse boa e não houvesse, da parte do homem, a obrigação de procurar a verdadeira religião ensinada por Jesus Cristo, como lembrou o Concílio.

Jesus ensina-nos a lutar contra esta tentação: «Ao Senhor, teu Deus, é que hás-de adorar, só a Ele prestarás culto.» E um culto que Deus muito aprecia é o respeito pelas pessoas.

– «O Demónio levou-O depois a Jerusalém, colocou-O no cimo do Templo e disse-Lhe: «Se és Filho de Deus atira-Te daqui abaixo. Pois está escrito: ’Deus mandou aos Seus Anjos a respeito de Ti, para que eles Te guardem. ‘»

Fala-se muito em tentar a Deus. Este desvio consiste em querer que Deus faça tudo, mas sem contar com o que podemos fazer.

Não faltam pais que gostariam que os filhos fossem melhores, mas não fazem o que está ao seu alcance para o conseguir: rezar por eles, dar-lhes bom exemplo, ensiná-los e corrigi-los.

Também na nossa vida pessoal acontece isto mesmo: queremos melhorar espiritualmente, mas não encontramos tempo para a oração, declinamos sempre o convite para meios de formação espiritual, deixamos de lado as boas leituras e tantos outros meios que o Senhor deixou ao nosso alcance.

«Jesus respondeu-lhe:’ Não tentarás o Senhor, teu Deus.’»

Na Celebração da Eucaristia de cada Domingo, procuramos fortalecer-nos contra todas estas seduções. Só o atleta que se alimenta convenientemente e se mantém esclarecido sobre as dificuldades que vai enfrentar na sua competição desportiva pode sonhar com a vitória.

Confiamos na ajuda de Nossa Senhora, a vencedora do Dragão, para responder com generosidade ao convite que o Senhor nos apresenta nesta Quaresma.

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