13 de setembro de 2015 – 24º Domingo do Tempo comum – Ano B

Fugimos, por instinto, do que nos custa algum sacrifício. Ao princípio, começamos por deixar de lado o que pertence à esfera da generosidade, não dos mandamentos da Lei de Deus.

Mas esta atitude em breve nos leva a transgredir também estes, porque a falta de generosidade é um plano inclinado: recusa na aceitação dos filhos, na seriedade dos negócios e trabalho, na missa dominical, até ao abandono total.

Ao mesmo tempo, instintivamente, procuramos encontrar uma justificação para o nosso descaminho: Deus – pensamos – nos pede, porque não nos poderia pedir, aquilo que nos custa, porque é Pai. Esquecemos, nesta caminhada de cegueira, que os pais, porque amam os filhos, pedem-lhes esforços para superarem as próprias limitações.

  1. A virtude e o dom da fortaleza

O Servo de Yavéh, figura misteriosa do Antigo Testamento em que alguns dos santos Padres vêem a figura de Cristo no mistério da Sua Paixão, é uma pregação viva sobre a virtude da fortaleza.

  1. a) A fortaleza, virtude humana e cristã. «Apresentei as costas àqueles que me batiam e a face aos que me arrancavam a barba; não desviei o meu rosto dos que me insultavam e cuspiam

A fortaleza é uma das quarto virtudes cardiais e é também um dom do Espírito Santo que nos ajuda a participar da fortaleza e Jesus Cristo, levando-nos, nas situações com dificuldade, a assumir um comportamento como se Ele estivesse em nosso lugar.

Actua em dois sentidos: leva-nos a aguentar a pé firme, quando tentam fazer-nos recuar do lugar onde o Senhor nos quer; e leva-nos a empreender coisas difíceis por Seu amor.

A nossa vontade foi enfraquecida pelo pecado original e pelos pecados pessoais. Muitas vezes acobardamo-nos e recuamos duma posição em que Deus nos queria firmes; outras, renunciamos a fazer o bem quando a vontade de Deus no-lo pedia.

Um exemplo gráfico da virtude da Fortaleza são os mártires de todos os tempos. Conscientes de que Deus queria o seu testemunho – mártir quer dizer isto mesmo – nada os fez demover de confessar a sua fidelidade a Jesus Cristo.

Exemplos de Fortaleza são também os pais e os evangelizadores de todos os tempos, empreendendo coisas difíceis, rodeados de mil obstáculos, para fazer o que Deus quer.

Na verdade, não há qualquer virtude, se não houver a da Fortaleza, porque falta a constância no bem, condição para que haja uma virtude.

  1. b) Sem a fortaleza não podemos seguir a Cristo. «Mas o Senhor Deus veio em meu auxílio e por isso não fiquei envergonhado

A fortaleza é-nos indispensável nos caminhos de Deus e até em simples caminhar humano, porque estamos «doentes»: temos inclinações para o mal e custa-nos a perseverança no bem.

Cada um de nós experimenta a dura realidade de que fala S. Paulo: «Eu não faço todo o bem que quero e faço algum mal que não quero. Quem me libertará este corpo e morte?» (Rom 7, 15).

Não se trata de andar à procura do que custa, mas de aguentar com fortaleza no caminho do bem e da virtude iniciado, também quando nos passou o entusiasmo, estamos cansados ou sentimos a tentação de abandonar tudo.

Nos caminhos da vida, temos de imitar os atletas: com exercício sucessivos, eles vão conquistando o domínio sobre o corpo e o controle dos seus movimentos. Temos de exercitar e fortalecer a vontade, renunciando, de vez em quando, a pequenas coisas lícitas, para conseguirmos, quando é preciso, vencer em coisas ilícitas.

A Fortaleza vem-nos de Deus. Reconheçamo-lo com humildade e peçamo-la instantemente ao Senhor, especialmente quando se nos apresentar uma batalha difícil de vencer.

  1. c) Abraçar a cruz da vida. «O Senhor Deus vem em meu auxílio. Quem ousará condenar-me

Sem idealismos, devemos compreender que o Senhor não nos propõe uma cruz ideal, mas a cruz real que temos aos ombros: o nosso feito, nem sempre agradável aos que vivem connosco; a maior ou menor qualidade de vida, com as suas normais limitações; as exigências da vida em família que nos obrigam, muitas vezes, a renunciar aos próprios gostos; o trabalho, que nem sempre é aquele de que mais gostamos; as limitações pessoais e do ambiente.

O que o Senhor nos propõe é que procuremos ser realistas, abraçando a cruz de cada dia, sem sonhos nem outros modos de fuga, procurando santificar-nos com as realidades de cada dia.

Santo Agostinho, com fina psicologia faz uma observação muito apropriada; «Tenho notado que os burros, quando não querem levar a carga. Caminham pelas beiras.» Assim é: quando queremos fugir à cruz real, refugiamo-nos no sonho de cruzes ideais.

Uma das notas que sobressai nas palavras do «Servo de Jahwéh» consiste na forma absoluta como ele se entrega aos projetos de Deus.

Diante do chamamento do Senhor, ele não resiste, não discute, «não recua um passo»; mas assume, com total obediência e fidelidade, os desafios que Deus lhe dirige, mesmo quando tem de percorrer um caminho de sofrimento e de morte.

Para nós, que vivemos envolvidos pela cultura da facilidade e do comodismo, que temos medo de arriscar, que preferimos fechar-nos no nosso «cantinho» protegido, arrumado e seguro, o «Servo de Jahwéh» lança uma poderosa interpelação… É preciso abraçar, com coragem e coerência o projeto que Deus nos confia, mesmo quando esse projeto se cumpre no meio da oposição do mundo; é preciso deixarmo-nos desafiar por Deus e acolher, com generosidade, as propostas que Ele nos faz; é preciso assumirmos o papel que Deus nos chama a desempenhar e empenharmo-nos na transformação do mundo.

  1. A Redenção pela Cruz
  2. a) Jesus Cristo, Redentor do mundo. «’E vós, quem dizeis que Eu sou?’ Pedro tomou a palavra e respondeu: ‘Tu és o Messias‘.»

Depois de várias respostas falhadas à pergunta de Jesus, Pedro, não com os recursos da inteligência humana, mas iluminado por Deus, dá a resposta certa: Jesus é o ‘Messias’ prometido.

O Senhor confirma esta profissão de fé do Príncipe dos Apóstolos que logo mostra não ter compreendido o que disse. Na verdade, Pedro opõe-se com todas as forças ao projeto de Deus: a Redenção da humanidade não deve passar pela cruz: pela Paixão e Morte, para chegar à Ressurreição.

Quem é Jesus? O que é que «os homens» dizem de Jesus? As pessoas interrogam-se sobre Ele? Para muitos, é um desconhecido; outros vêem em Jesus um homem bom, generoso, atento aos sofrimentos dos outros, que sonhou com um mundo diferente; outros ainda vêem em Jesus um admirável «mestre» de moral, que tinha uma proposta de vida «interessante», mas que não conseguiu impor os seus valores; alguns vêem em Jesus um admirável condutor de massas, que lançou uma chama de esperança nos corações das multidões carentes e órfãs, mas que passou de moda quando as multidões deixaram de se interessar pelo fenómeno; outros, ainda, vêem em Jesus um revolucionário, ingénuo e inconsequente, preocupado em construir uma sociedade mais justa e mais livre, que procurou promover os pobres e os marginais e que foi eliminado pelos poderosos, preocupados em manter tudo como estava.

Talvez sem nos apercebermos, sonhamos com um tipo de vida em que o Senhor retire do nosso caminho todos os obstáculos, todos os espinhos, e nos faça caminhar suavemente sobre um tapete de rosas… que não nos peça sacrifícios, porque isso é politicamente incorreto.

À mais pequena contrariedade – dor de cabeça, falta de compreensão dos outros, perda de emprego ou qualquer outra – a nossa fé entra em crise, porque Deus não satisfez todos os nossos caprichos, ou estávamos à espera de que Ele nos substituísse nos esforços necessários.

 

  1. b) A Redenção passa pela Paixão e Morte. «Depois, começou a ensinar-lhes que o Filho do homem tinha de sofrer muito, […] de ser morto e ressuscitar três dias depois

A vitória final de Jesus passa pela Paixão e Morte, pela derrota completa, pelo fracasso humanamente considerado.

O Evangelho deste domingo coloca frente a frente a lógica dos homens (Pedro) e a lógica de Deus (Jesus).

A lógica dos homens aposta no poder, no domínio, no triunfo, no êxito; garante-nos que a vida só tem sentido se estivermos do lado dos vencedores, se tivermos dinheiro em abundância, se formos reconhecidos e incensados pelas multidões, se tivermos acesso às festas onde se reúne a alta sociedade, se tivermos lugar no conselho de administração da empresa.

A lógica de Deus aposta na entrega da vida a Deus e aos irmãos; garante-nos que a vida só faz sentido se assumirmos os valores do Reino e vivermos no amor, na partilha, no serviço, na solidariedade, na humildade, na simplicidade.

Na minha vida de cada dia, estas duas perspetivas confrontam-se, a par e passo… Qual é a minha escolha? Na minha perspetiva, qual destas duas propostas apresenta um caminho de felicidade seguro e duradouro?

  1. c) Seguir a Cristo heroicamente. «Se alguém quiser seguir-Me, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-Me

Como nos custa renunciar aos próprios gostos e projetos, até porque nos parecem bons!

O que é «renunciar a si mesmo»? É não deixar que o egoísmo, o orgulho, o comodismo, a auto-suficiência dominem a vida. O seguidor de Jesus não vive fechado no seu cantinho, a olhar para si mesmo, indiferente aos dramas que se passam à sua volta, insensível às necessidades dos irmãos, alheado das lutas e reivindicações dos outros homens; mas vive para Deus e na solidariedade, na partilha e no serviço aos irmãos.

Renunciar a si mesmo é começar a luta dentro de nós, pela oração, a mortificação, o trabalho e o apostolado.

O que é «tomar a cruz»? É amar até às últimas consequências, até à morte. É dar-se sem medida. O seguidor de Jesus é aquele que está disposto a dar a vida para que os seus irmãos sejam mais livres e mais felizes.

Por isso, o cristão não tem medo de lutar contra a injustiça, a exploração, a miséria, o pecado, mesmo que isso signifique enfrentar a morte, a tortura e as represálias dos poderosos.

Foi neste caminho que se santificaram Nossa Senhora, S. José e os santos de todos os tempos.

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