Um dos temas mais recorrentes e inspiradores do magistério do Papa Francisco é o “cultura do encontro”. É uma questão mais árdua do que parece, mas também mais decisiva do que pensamos. Árdua porque o encontro não é infelizmente a tendência habitual gerada pela lógica competitiva e individualista hoje dominantes. Árdua porque parece mais fácil a muitos níveis (sejam eles culturais, ideológicos, psicológicos, organizacionais, ou outros) reproduzir confortavelmente modelos isolacionistas do que dispor-se a uma abertura, a um acolhimento e valorização daquilo que o outro é, ao risco de um projeto comum centrado não apenas no bem individual, mas naquilo que é melhor para o todo. E há que reconhecer que o efeito de fragmentação que o desencontro produz, não é apenas um problema que afeta o mundo. O Papa Francisco não se tem cansado de repetir que essa é uma ferida que dilacera também o corpo eclesial. Tantas chamadas de atenção deveriam construir um ponto de séria reflexão. É, de facto, um aspeto em que pensamos pouco: o da qualidade das relações intra-eclesiais. E é essencial que elas sejam avaliadas, cuidadas, reparadas… Neste como noutros assuntos a Igreja das origens é uma fonte de interpelação e inspiração. Desde o «vede como eles se amam» (Act 4,32)- exclamação que a primeiríssima comunidade cristã de Jerusalém despertava aos que a olhavam de fora
-à preocupação permanente do apóstolo Paulo para que a comunhão na Igreja fosse mais do que uma bela palavra.
Podemos dizer que a “cultura do encontro” em que insiste o Papa Francisco corresponde ao ADN da própria Igreja. A sua vitalidade está realmente nessa sabedoria, que é competência humana desenvolvida a partir do dom do Espírito Santo, para congregar, para aprofundar criativamente os dinamismos de comunhão, para fazer cair os muros da inimizade, para colocar em prática a misericórdia, para instaurar uma cultura de diálogo, de corresponsabilidade e de cooperação. Precisamos de uma cultura do encontro, fora e dentro.
Fonte:
Revista Rosário de Maria
Ano 70 | julho de 2014 | nº 738
Autor: José Tolentino de Mendonça