Luzes de Natal

Muito antes da data em que se convencionou celebrar o nascimento de Jesus, o Menino de Belém, já há, por todo o mundo, múltiplos sinais festivos de Natal. Os mais vistosos e apelativos são as luzes multicores, que, em grande profusão, iluminam os grandes espaços citadinos, as montras comerciais e os próprios lares das famílias, mormente aqueles em que vivem crianças, que vibram, como ninguém, com estes espetáculos, multimédia que associam facilmente às prendas com que são abundantemente mimoseadas.

 Numa destas noites calmas e frias de Dezembro, calcorreadas algumas artérias do burgo, onde se concentra o comércio e as luzes de Natal convidam a observar as pessoas e as coisas, pusemo-nos a indagar, no nosso espírito, o texto e o contexto desta grande Festa que, para os cristãos, é o Natal de Cristo, para muitos, simplesmente a Festa da Família e, para alguns, coisa nenhuma, que é como quem diz, uma data sem expressão nem significado.

 À luz das luzes de Natal e com outras “luzes” – a leitura da vida real, o que vemos, ouvimos e lemos e também a visão do mundo que a fé cristã, e só ela, nos garante, vieram ao de cima, no nosso pensamento, muitas realidades cruas e nuas e também alguns motivos da esperança num futuro de paz e fraternidade para a humanidade nos tempos que aí vêm.

 Aqui vão, com a espontaneidade com que nos vieram à mente, alguns tópicos da nossa reflexão intimista em tempo de Advento. O espetáculo das iluminações está a revelar-nos, com maior realismo, a verdade de um comércio tradicional – aquele que anima os centros citadinos – a agonizar, com lojas vazias de clientes, porque o dinheiro é escasso e lá se vai todo para os chineses, centros comerciais e grandes superfícies. E os comerciantes, aflitos, a deitar as mãos à cabeça e a interrogarem-se: Onde é que isto vai parar? Que vai ser da nossa vida? E os cidadãos, perplexos também, com o abandono dos centros históricos, que outrora foram centros de convívio, a isolarem-se no seu mundo de interesses familiares e económicos, e a demitirem-se dos seus deveres de cidadania e de intervenção cívica em prol do bem comum, porque, pensam e dizem, não vale a pena… Cada um que se governe… Isto não tem conserto… As luzes de Natal acentuam ainda, e de que modo, a grande doença do século – a solidão de milhões de pessoas por esse mundo fora, algumas com nome e rosto, na nossa família e na nossa rua. Pessoas idosas, quase sempre, a viverem sozinhas em suas casas ou simplesmente arrumadas, como trastes inúteis, em qualquer Lar da Terceira Idade. Muitas com magras reformas, que mal dão para aviar os remédios na farmácia e quase todas inconformadas com a vida madrasta que as atirou para a negra solidão, porque a família ou desapareceu ou as renegou impiedosamente.

A par da miséria imerecida e da tragédia das muitas solidões dos nossos contemporâneos, os luxos e esbanjamentos escandalosos de uns quantos que se passeiam em carros topo de gama e jactos particulares para fugirem à rotina do Natal, no seu país, a gastarem fortunas nas férias da neve, lá por Andorra ou pela Suíça, ou, mais longe, em países exóticos, com temperaturas mais amenas, como o Brasil e as Caraíbas.

À luz das luzes do Natal, estamos a descobrir aquela que devia ser a festa do aniversariante – Jesus Cristo, Filho de Deus, nascido em Belém – cada vez mais paganizada, porque substituída por um “Pai Natal” importado, esse, sim, exclusivamente comercial, por muitas festas sociais e familiares, muito circo, muitos passeios, muitos espetáculos, muitas consoadas, muita pretensa solidariedade e fraternidade, nas mensagens que se mandam e recebem, e com um grande vazio na alma, porque faltam razões de viver, falta verdadeiro espírito natalício, falta fé no Menino, que é o Filho de Deus.

A par destas e de outras sombras de Natal, há também luzes que brilham mais e, apesar de tudo, nos devem incutir esperança num mundo melhor. Descobrem-se, por exemplo, pelo Natal, almas extremamente gene- rosas, que dão muito do que têm e se dão a si mesmas aos irmãos pobres, aqueles que não têm nada nem  ninguém. São multidões de voluntários a receber géneros nos supermercados para o Banco Ali- mentar contra a Fome, a promover reuniões de festa com os sem-abrigo, com crianças, com idosos, com imigrantes, são vocações que despertam, com estes gestos solidários, para o outro e, vencendo o seu natural egoísmo, se dispõem a fazer felizes quantos se atravessam nos caminhos das suas vidas.

Luzes de Natal, do verdadeiro Natal, são, sobretudo, as marcas da nossa cultura cristã, nos presépios que se mostram nos nossos museus, ou noutros, mais ingénuos, mas igual- mente belos, armados nas nossas igrejas e em muitos lares cristãos, nas lindas canções do “Menino”, que soam por aldeias e cidades, e nos próprios enfeites religiosos que decoram lugares públicos e particulares, a lembrar que este Natal, como todos os Natais, é tempo de evocar Jesus Cristo e de viver a Boa Nova que os Anjos anunciaram em Belém de Judá.

As luzes de Natal terão necessariamente de nos levar ao Presépio, de nos mostrar o “Emmanuel” anunciado pelos Profetas, o Deus connosco, presente na história dos povos e de cada um de nós, de nos comprometer com a salvação pro- clamada no primeiro Natal, de nos ajudar a redescobrir a nossa vocação humana e cristã, vocação de Solidariedade, de Paz e de Amor, neste mundo concreto de pessoas, um mundo tão recheado de problemas angustiantes, mas também um mundo onde Deus continua presente e onde nós, os que acreditamos em Deus, podemos e devemos ser arautos de Esperança.

 

 

 

Autor

Alberto Batista

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