Não; o gosto não é meu, pois que tenho grande dificuldade em lidar com o calor. O gosto está afirmado numa canção e, de certeza, nas preferências de muitas pessoas. O Verão é, de facto, tempo privilegiado de férias e ocasião escolhida para muitos acontecimentos festivos e comemorativos, por ser mais fácil reunir amigos e familiares.
No Verão celebram-se, por isso, casamentos e batizados, festejam-se os padroeiros das paróquias, homenageiam-se emigrantes e até se retomam convívios político-partidários congelados nos demais meses do ano…
Com desejo apressado de tudo agendar para o mesmo período, não raro se assiste a algum improviso, com os interessados a tentarem ultrapassar regras e exigências: uns alegam dispor de escassos dias para casar na terra; outros, para batizar os filhos nascidos além-fronteiras; uns terceiros desejam a todo o custo cumprir uma promessa adiada, pois está na hora de agradecer ao santo da sua devoção.
Pressionados, os párocos vêem-se e desejam-se para respeitar normas pastorais e, simultaneamente, corresponder a pedidos vários – avaliando qual o mal menor (ou bem maior) de cada escolha. Muitas vezes, fazem-no espreitando por cima do ombro para a igreja do lado, de modo a evitar alguma dissonância de critérios, pois que esta é matéria que qualquer freguês não se esquecerá de explorar…
Sem experiência, pois que em 42 anos de sacerdócio só fui pároco (substituto) 4 meses, tenho emprestado os ouvidos a desabafos de colegas ou de paroquianos — sem capacidade de responder senão com elegantes teorias…
Constato, porém – até porque sou minhoto e, durante o Verão, o Minho é uma romaria — que o assunto merece ser tratado de forma séria. Registo, por isso, com alegria, a recente Nota Pastoral de D. José Cordeiro, com o dedo posto na ferida. Pelo menos no que às festas diz respeito: «(…) muitos mordomos e comissões de festas religiosas populares dedicam-se, de alma e coração, ao serviço deste espírito genuinamente cristão que envolve as festas das nossas comunidades paroquiais. Contudo, verificamos que alguns mordomos e comissões de festas se movem mais nas vertentes económica e lúdica das festas do que na sua dimensão cristã fundamental. É um enorme desafio para nós, superar o aspeto pagão, comercial, utilitarista e laicista da festa».
Sim; é um enorme desafio.
Penso que há todo um “cuidadoso discernimento” a fazer para não deitar fora a criança com a água do banho. Ou seja, para não perder, numa espécie de fúria purificadora, tesouros de piedade, mesmo que necessária e eventualmente carecidos de evangelização.
Já no que a casamentos e batizados diz respeito, massacra-me o relato de um amigo que, em tempos de início dos CPMs, quis que por eles passasse um par de noivos de um bairro de Braga.
A rapariga ouviu os argumentos do jovem coadjutor, que defendia o adiamento da celebração para que pudessem “entrar” no próximo curso. Cansada e incapaz de perceber as razões que lhe eram apresentadas, a jovem rematou o diálogo com uma contundente ameaça: “Ai o senhor abade põe-se com esquisitices?!.. Olhe, não faz mal; eu aputo-me!…”
Nunca o colega me disse o desfecho do caso. Mas fico preocupado todas as vezes que oiço confundir exigência e seriedade com impertinente esquisitice! Confiando que nunca sejamos esquisitamente sérios…
João Aguiar Campos,
Secretariado Nacional das Comunicações Sociais