A expulsão dos vendedores do templo é referida pelos quatro evangelistas, e isto demonstra a importância que eles atribuem ao facto.
A casa de oração tinha sido transformada, pelos seus próprios ministros, num lugar de mercado.
O episódio dramático narrado no Evangelho de hoje deve ser inserido neste contexto. Acontece por ocasião de uma festa da Páscoa em que Jesus, chegando ao templo, depara com o espectáculo indigno acima descrito.
As emoções que experimentou não são referidas por nenhum evangelista, mas são fáceis de intuir considerando a reação que teve: não pronunciou uma única palavra, fez um chicote, servindo-se provavelmente das cordas com que prendiam os animais, e começou, com fúria, a expulsar a todos do Pórtico Régio, atirou pelos ares as cadeiras, o dinheiro e as gaiolas das pombas; depois, sem parar um momento, desceu pela escadaria e, apanhando de surpresa os cambistas, derrubou as mesas e atirou por terra as moedas ali amontoadas.
João refere também – é o único dos evangelistas a fazê-lo – que para além dos vendedores foram expulsas as ovelhas e os bois.
O gesto de Jesus decretou o fim da religião ligada à oferta de animais e afirmou a recusa, da parte de Deus, dos sacrifícios cruentos, cuja inconsciência já tinha sido denunciada pelos profetas:
«De que me serve a mim a multidão das vossas vítimas – diz o Senhor. – Estou farto de holocaustos de carneiros, de gordura de bezerros; não me agrada o sangue de vitelos, de cordeiros nem de bodes». Na prova máxima de amor que Jesus estava para dar iria ser indicado o único sacrifício que agrada ao Pai, aquele que João explica assim aos cristãos das suas comunidades: « Foi com isto que ficámos a conhecer o amor: Ele, Jesus, deu a sua vida por nós; assim também nós devemos dar a vida pelos nossos irmãos».
O gesto realizado por Jesus no templo é surpreendente. Daquele que se tinha apresentado como ««manso e humilde de coração» ninguém esperaria uma reação semelhante. Porque se comportou assim? A explicação está nas duas frases que Ele pronunciou.
A primeira é: «Tirai tudo isto saqui e não façais da casa de meu Pai casa de comércio». Referia-se a um oráculo do profeta Zacarias que, depois de ter anunciado o aparecimento de um mundo completamente renovado, no qual o Senhor seria o rei de toda a terra e o país seria transformado num jardim, concluía: «Naquele dia já não haverá mais comerciantes no templo do Senhor do universo».
Ao purificar o templo dos mercadores, Jesus manifestou a sua condenação, severa e sem apelo, contra todo o tipo de associação entre religião e dinheiro, entre o culto ao Senhor e os interesses económicos. Do homem Deus espera apenas amor, e o amor é gratuito, manifesta-se e alimenta-se somente através de dons generosos e desinteressados. Para evitar equívocos perigosos, Jesus recomendou aos seus discípulos: «Recebestes de graça, dai de graça. Não possuais ouro, nem prata, nem cobre em vossos cintos; nem alforge para o caminho, nem duas túnicas, nem sandálias, nem cajado; pois o trabalhador merece o seu sustento».
Mas o ensinamento mais importante encontra-se na segunda frase: «Destrui este templo e em três dias o levantarei». Já não se referia ao comércio e aos tráficos indignos que aconteciam naquele santuário, mas à inauguração de um novo templo; anunciava o início de um novo culto. É esclarecedor o comentário do evangelista: «Jesus falava do templo do seu corpo».
Agora é claro: o único sacrifício agradável a Deus é o dom da vida, são as obras de amor, o serviço generoso prestado ao outro, sobretudo ao mais pobre, ao doente, ao marginalizado, ao que tem fome, ao que está nu. Quem se inclina perante o irmão para o servir realiza um gesto sacerdotal: unido a Cristo, templo de Deus, faz subir ao Céu o perfume suave de uma oferta pura e santa.
Que sentido têm então as nossas liturgias, os sacramentos, os cânticos, as procissões, as peregrinações, as orações comunitárias, as práticas devocioneiras?