Por três vezes no Evangelho de Lucas são pedidas a Jesus indicações acerca da herança: «Que hei-de fazer para possuir a vida eterna» perguntam, primeiro um doutor da lei, depois um notável. Em ambos os casos Jesus responde explicando detalhadamente quais são as condições para participar desta herança.
Num diálogo com os discípulos, Ele mesmo introduz o discurso sobre a herança eterna: «E todo aquele que tiver deixado casas, irmãos, irmãs, pai, mãe, filhos, ou campos por causa do meu nome, receberá cem vezes mais e terá por herança a vida eterna».
O terceiro pedido é do Evangelho de hoje. Dois irmãos que não se conseguem pôr-se de acordo.
Note-se o facto curioso: a herança deveria ser dividida, mas, pelo contrário, é ela a dividir.
A armadilha para a qual o dinheiro arrasta quem não está muito atento é manhosa. Arrasta-te para onde quer, organiza as coisas em teu lugar, separa-te dos amigos, divide tua família, faz-te esquecer até mesmo Deus. Sobretudo, engana-te porque expulsa da tua mente o pensamento da morte.
No passado, a morte era usada como um espantalho. Hoje, estamos na presença do fenómeno oposto, mas igualmente deletério: procura-se fazer esquecer que no próprio momento em que se começa a viver se começa também a morrer.
A insensatez, o embotamento provocados pelo dinheiro são facilmente releváveis no facto que, precisamente em presença da morte 8ª divisão de uma herança tem lugar após uma morte), a avidez leva a que se remova da mente o pensamento da morte.
Jesus nunca desprezou os bens deste mundo, mas avisou para o perigo de nos tornarmos escravos deles.
O ideal do cristão não é uma vida miserável!
No final da parábola é indicado o erro cometido pelo agricultor rico. Ele não é condenado porque produziu muitos bens, porque trabalhou, porque se empenhou, mas porque acumulou para si próprio, e não enriqueceu aos olhos de Deus. Estes os dois males criados pela cegueira dos bens.
O primeiro: enriquecer sozinho, acumular bens para si próprio sem pensar nos outros. A riqueza deve ser aumentada, mas para todos, não apenas para alguns. São incompatíveis com o Evangelho a «cobiça» a «avidez insaciável do possesso», os sentimentos e os pensamentos insensatos de quem, como o agricultor da parábola, repete obsessivamente aquele maldito pronome possessivo: «meu». Quando as energias de todos forem utilizadas para aumentar não o «meu» e o «teu», mas o nosso, então serão eliminadas as causas das guerras, das discórdias, da fome, dos problemas de herança.
O segundo mal: ter excluído Deus da própria vida, substituindo-o por um ídolo. Esta escolha leva à «insensatez» e o sintoma mais evidente é a remoção do pensamento da morte.
Quem idolatra o dinheiro torna-se um paranóico, não vive num mundo real, mas no mundo que construiu para si mesmo e que imagina ser eterno; esquece que não sabe «quanto tempo viverá ainda, e como é breve a vida», não considera que «ele passa como simples sombra. É em vão que se agita, amontoa riquezas e não sabe para quem ficar».
Quem não possui campos e não tem uma conta no banco não é tocado por esta parábola? Jesus não acautela quem tem muitos bens, mas todo aquele que acumula para si próprio. Pode-se ter pouco dinheiro e ter um «coração de rico»
Todos se devem lembrar de que os tesouros deste mundo são traiçoeiros, não nos acompanham para a outra vida.