20 de junho de 2019 – Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo

A Igreja reserva dois dias no ano litúrgico à celebração do mistério da Santíssima Eucaristia: a Quinta-Feira Santa e a Solenidade do Corpo e Sangue do Senhor.

Com profundo agradecimento, celebrámos em Quinta Feria Santa — no início do Tríduo Sacro Pascal — a instituição da Santíssima Eucaristia e do sacramento da Ordem — o sacerdócio ministerial — durante a Última Ceia.

Uma vez que este espaço litúrgico não se prestava a grandes manifestações externas, desde há muitos anos que a Igreja sentiu a necessidade de celebrar com manifestações externas de alegria e gratidão a Presença Real de Jesus Cristo na Santíssima Eucaristia.

Foi este o desejo que fez nascer esta Solenidade na qual muitos meninos e meninas são carinhosamente conduzidos à mesa da Sagrada Comunhão.

1. Jesus, Sumo e Eterno Sacerdote

Narra o Livro do Génesis, no capítulo 14, que quatro reis da Mesopotâmia empreenderam uma guerra contra as cinco cidades do Vale de Sidim, onde se encontra hoje o mar Morto ou Salgado. O motivo terá sido que as Cidades da Planície tinham sido fundadas para lhes pagarem tributo por doze anos, mas revoltaram-se no décimo terceiro.

Os quatro reis vieram fazer guerra e derrotaram estes povos, levando prisioneiras muitas pessoas, entre as quais Lot, sobrinho de Abraão.

Então o santo Patriarca reuniu rapidamente uma aliança de cinco reis e derrotou-os, restituindo à liberdade a Lot.

É neste contexto que faz aparição o sacerdote Melquisedec, figura de Jesus Cristo no Antigo Testamento.

a) Sacerdócio eterno de Cristo. «Naqueles dias, Melquisedec, rei de Salém, trouxe pão e vinho.»

Melquisedec veio ao encontro de Abraão e ofereceu um sacrifício de acção de graças de pão e vinho. Abraão, por sua vez, ofereceu-lhe os dízimos de todos os despojos de guerra.

O autor da Carta aos Hebreus retoma este acontecimento da bíblia para nos explicar o sacerdócio de Jesus Cristo.

Melquisedec aparece aqui como uma figura de Jesus Cristo. Na verdade:

• Não se conhece a sua linhagem humana, fazendo-nos evocar a geração eterna do Verbo;

• Abraão reconhece a superioridade de Melquisedec, pois oferece-lhe o dízimo dos despojos;

• Ele é sacerdócio do Altíssimo. Jesus Cristo é Sumo e único Sacerdote.

• O pão e o vinho que o sacerdote oferece ao santo Patriarca lembra a matéria da Eucaristia.

Em todos os tempos, os povos sentiram a necessidade de terem sacerdotes, vítimas e sacrifícios. O holocausto, com a destruição total da vítima, recorda ao homem que ele deveria pagar com a vida os seus pecados, mas é substituído na morte por uma vítima simbólica. Jesus Cristo foi constituído pelo Pai o único e sumo Sacerdote. O autor da Carta aos Hebreus escreveu: «As vítimas e os sacrifícios não foram suficientes para Te aplacar. Então, Eu disse: “Eis-Me aqui, para fazer, ó Pai a Tua vontade.»

Jesus Cristo instituiu como sacrifício único e perpétuo a ser renovado — não repetido — sobre os nossos altares.

A Liturgia da Igreja estabeleceu um dia — o Dia do Senhor — em que o fiel deve estar presente nesta celebração, agradecendo ao Senhor que o agregue a Si mesmo neste sacrifício ao Pai.

b) Oferece-Se ao Pai. «Era sacerdote do Deus Altíssimo e abençoou Abraão, dizendo: “Abençoado seja Abraão pelo Deus Altíssimo, criador do céu e da terra. Bendito seja o Deus Altíssimo, que entregou nas tuas mãos os teus inimigos”.»

Ainda no seio materno, Jesus diz que vem ao mundo para fazer a vontade do Pai. Toda a Sua vida foi isto mesmo, desde o primeiro instante da Incarnação até ao último suspiro no Calvário.

Para que a nossa vida seja uma Eucaristia permanente, há-de ser uma luta generosa para fazer a vontade de Deus que Ele nos manifesta nos Seus Mandamentos e nas mil circunstâncias da vida: na vivência da vocação, no trabalho, no relacionamento com os outros.

Não faz, portanto, sentido, querer participar plenamente na Eucaristia — comungar — sem estar na graça de Deus. Para que isto nos seja possível, Jesus deixou na santa Igreja a confissão sacramental e anima-nos a recorrer a ela muitas vezes.

Desgraçadamente, não faltam pessoas que confundem a fé e a vida em graça com uma emoção momentânea, numa primeira comunhão de um familiar, num casamento ou em qualquer outra celebração e aproximam-se atrevidamente da comunhão, cometendo um sacrilégio.

Não podemos separar a participação plena na Eucaristia — na comunhão — sem estar na graça de Deus, recuperada, quando necessário, por uma comunhão bem feita. Quando alguém está em pecado mortal, não lhe basta, ordinariamente, o acto de contrição, para se poder aproximar da Mesa da Eucaristia.

S. Paulo fala com dureza deste pecado: «Não podeis beber o cálice do Senhor e o cálice dos demónios; não podeis ser participantes da mesa do Senhor e da mesa dos demónios.» (I Cor 10, 21).

E noutra passagem: «qualquer que comer este pão, ou beber o cálice do Senhor indignamente, será culpado do corpo e do sangue do Senhor. Examine-se, pois, o homem a si mesmo, e assim coma deste pão e beba deste cálice. Porque o que come e bebe indignamente, come e bebe para sua própria condenação, não discernindo o corpo do Senhor.» (1 Coríntios 11:27-29).

c) Dá-Se-nos como Alimento. «E Abraão deu-lhe a dízima de tudo.»

O Corpo e o Sangue de Jesus Cristo que recebemos na Sagrada Comunhão são verdadeiro Alimento da nossa vida divina, de modo que não podemos viver sem ele.

• Alimento da nossa vida em graça. Mas ao contrário do que acontece com o alimento do corpo, não é o alimento que se transforma em nós, mas nós que nos transformamos neste Alimento divino que é Jesus Cristo.

É preciso acabar com o cristianismo rotineiro à margem de todo o amor de Deus, que se contenta com uma comunhão e longe a longe — uma ou algumas vezes por ano — para não ter que viver com cuidado, defendendo a vida da graça de Deus que recebeu no Baptismo.

• A santa Igreja ensina-nos com disposições havemos de tomar este Alimento divino:

— Com toda a fé, sabendo e pensando que na hóstia está Jesus Cristo todo inteiro, verdadeiro Corpo, Sangue, Alma e Divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo, tão real e perfeitamente como está no Céu.

— Com reverência, isto é, com respeito. Este manifesta-se no nosso modo de vestir e na compostura com que nos aproximamos da Sagrada Mesa.

— Com amor. Quando nos convidam para uma festa, sentimos a necessidade de participar nela com alguma oferta. Que levamos para oferecer ao Senhor, quando vamos comungar?

Sobre os modos de comungar, a santa Igreja estabeleceu diversas indicações.

Quando a comunhão é em público, devemos comungar de pé; mas em particular, podemos comungar de joelhos, se o sacerdote estiver de acordo.

Ultimamente, abriu-se ainda a possibilidade de duas formas de comungar: na boca, a tradicional e a mais ordinária.

Pode haver, porém, motivo para comungar na mão. Não se faça por exibicionismo ou porque algum se considera um “cristão de primeira classe” por fazer isto.

As pessoas que comungam na mão — como as outras — devem aprofundar continuamente a doutrina sobre a Presença Real.

Verifica-se, por vezes, que o fazem levianamente, sem cuidado com os fragmentos que ficam na mão, olhando para todos os lados, sem qualquer recolhimento.

O Anjo de Portugal queixa-se de ultrajes, sacrilégios e indiferenças. Evitemos ter qualquer destes pecados contra a Santíssima Eucaristia.

Como Pedro aos demais Apóstolos, nas margens do Lago, nós exclamamos diante da hóstia consagrada: «É o Senhor!»

2. A Eucaristia, alimento da Vida

a) A situação actual do mundo. «O dia começava a declinar. Então os Doze aproximaram-se e disseram-Lhe: “Manda embora a multidão para ir procurar pousada e alimento às aldeias e casais mais próximos, pois aqui estamos num local deserto”.»

Vivemos hoje com muitas dificuldades, apesar dos meios que temos para levar uma vida com o mínimo de dificuldades.

Há melhores e mais confortáveis casas, melhor e mais abundante alimentação, transportes rápidos e cómodos como nunca, meios fáceis de comunicação, maior circulação dinheiro.

Todavia, as pessoas vivem tristes e resmungam por tudo e por nada, sem que possamos contentá-las.

Falta-lhes Deus e, por isso, estão em circunstâncias semelhantes às daquela multidão de que nos fala o Evangelho de hoje: vai-se aproximando a noite e eles não têm pão para comer, nem forças para o irem procurar longe ou dinheiro para o comprar.

Os pais sofrem com o descaminho dos filhos pela impiedade e pela droga; encontramos doenças sem cura; há multidões em descristianização galopante…

À nossa volta estão multidões famintas de amor, de carinho humano, de fé, de vida limpa, de amor de Deus.

Outros — os cristãos velhos do nosso meio — estão enfartados, com uma sensação de não precisarem de nada, mas a cair de fraqueza.

As pessoas querem voar sem asas, viverem saciadas sem tomar qualquer alimento, serem felizes sem Deus.

Tal como uma família não pode estar contente e feliz à mesa, se à sua porta há pessoas esfomeadas, também nós não podemos viver felizes, se não procurarmos fazer o que está ao nosso alcance para lhes minorar a fome.

b) Que podemos fazer. «Disse-lhes Jesus: “Dai-lhes vós de comer”. Mas eles responderam: “Não temos senão cinco pães e dois peixes… Só se formos nós mesmos comprar comida para todo este povo”.»

Perante a situação desta multidão destas cinco mil pessoas, uma é a solução humana apontada:

• A solução dos homens. Resume-se a não querer com a visão dos problemas. Foi a solução apontada pelos Apóstolos: «Manda embora a multidão para ir procurar pousada e alimento às aldeias e casais mais próximos, pois aqui estamos num local deserto».

Os Doze não queriam sofrer o incómodo de ver esta multidão em sofrimento. Mas o Mestre sabe que, mesmo que não vejamos os problemas, eles continuam a existir.

Quando olhamos o mundo sem a luz da fé, caímos no desânimo de melhorá-lo e torná-lo habitável.

É a tentação que os pais sentem de cruzar os braços perante os problemas dos filhos; ou o nosso quando queremos que o mundo melhore sem o nosso esforço.

Por dentro de nós está o desalento perante a própria incapacidade, o não contar com a ajuda de Deus. Tudo isto leva a deixar cair os braços.

• A solução de Jesus. Consiste no empenhamento pessoal, de mãos dadas com Deus. Foi preciso que entregassem todos os pães e todos os peixes que tinham.

— Comecemos por dar tudo o que está na nossa mão: a santidade pessoal procurada com sinceridade;

— A oração e mortificação com perseverança; fazer tudo o que é humanamente possível, não perder a paz e confiar no Senhor, fazendo a Sua vontade.

— É preciso confiar no Senhor e obedecer-Lhe. Encontramos tudo isto na vida dos santos. O Santo Cura d’Ars tomou conta duma paróquia paganizada e em breve se tornou modelo das outras. S. João Bosco preocupa-se com uma multidão de jovens que vêm para a cidade à procura de trabalho e são desorientados. S. Josemaria, com apenas vinte e seis anos e bom humor, abre no mundo um novo caminho de santidade.

c) O Senhor dá-Se-nos em Alimento. «Eu recebi do Senhor o que também vos transmiti: o Senhor Jesus, na noite em que ia ser entregue, tomou o pão e, dando graças, partiu-o e disse: «isto é o meu Corpo, entregue por vós. Fazei isto em memória de Mim.»

Para matar a fome desta multidão faminta constituída por cinco mil pessoas, Jesus multiplicou miraculosamente os cinco pães e dois peixes. Todos comeram e ficaram saciados. Para matar a fome do mundo de hoje, Ele multiplica prodigiosamente o Seu Corpo e Sangue.

Dois milagres de Jesus nos ajudam a compreender melhor o que se passa na Consagração da Missa.

Em Caná da Galileia, Jesus muda toda a substância da água em vinho; aqui, sem mudar a substância do pão e do peixe, multiplica-os.

Na Consagração acontecem as duas coisas: toda a substância do pão e do vinho são transubstanciadas no Corpo e Sangue do Senhor; mas Ele multiplica prodigiosamente a Sua Presença, de tal modo que cada uma das pessoas que comungam, recebe Cristo inteiro. Cantamos na Sequência da Missa deste dia: Quer o recebam mil, quer um só, todos recebem o mesmo, nem recebendo-o podem consumi-lo.

Ao fazer-nos apelo à fé na Santíssima Eucaristia, nesta Solenidade, Jesus Cristo deseja que a concretizemos na Comunhão frequente e bem feita. Se acreditamos que Ele é o Alimento insubstituível de que precisamos, por que não comungamos com frequência?

Quando o Santo Cura d’Ars estava para morrer, um sacerdote foi levar-lhe o Sagrado Viático e o santo começou a chorar. Quando lhe perguntaram porque choravam respondeu: “É tão triste comungar pela última vez!”

Maria e a Eucaristia. Poderíamos imaginar a aflição da mãe quando vê que o filho está devorado pela fome e se recusa comer?

A Santíssima Eucaristia é dom da Santíssima Virgem. É a Carne e o Sangue que Ele recebeu no seu seio imaculado que nós recebemos na Sagrada Comunhão.

Que Ele nos ajude a comungar cada vez melhor.

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