Deus serve-se da vida humana e da nossa linguagem para nos revelar as maravilhas da Sua doutrina.
Na Liturgia da Palavra deste 2.º Domingo do Tempo Comum, toma o amor humano entre o marido e a esposa para nos revelar o Seu Amor por nós.
1. O Amor de Deus para connosco
O amor de Deus para connosco permanecerá sempre um mistério, e não encontramos nada semelhante na terra.
A luz da Revelação ajuda-nos a vislumbrar — tanto quanto o pode fazer uma criatura iluminada pela fé — esta maravilha.
Amor fiel. «Por amor de Sião não me calarei, por amor de Jerusalém não terei repouso, enquanto a sua justiça não despontar como a aurora e a sua salvação não resplandecer como facho ardente. Os povos hão-de ver a tua justiça e todos os reis a tua glória.»
Hoje sentimos uma dificuldade muito especial e vislumbrar a riqueza do amor de Deus a cada um de nós, porque a palavra amor está cheia de enganos.
• Falsos amores. Alguns tomam o amor pela sensualidade, pelo entusiasmo dos sentidos que procura uma satisfação. Quando a sensualidade se cansa — porque os sentidos bem depressa estão saturados, dizem que o amor acabou. Este é o drama de muitos namoros e casamentos. Entre os dois não chegou a desenvolver-se um verdadeiro amor.
O amor de Deus por nós, não é como o amor das telenovelas que surge como as flores da primavera, para logo se desfazerem à primeira brisa de vento que passa.
Quando uma união matrimonial se desfaz por causa de uma doença, de um defeito ou de uma discussão, onde está a verdade daquelas palavras no dia da celebração: «Eu […], recebo-te por minha esposa — por meu marido — a ti […], e prometo ser-te fiel, amar-te e respeitar-te,
na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, todos os dias da nossa vida.»
Onde está o compromisso assumido diante das pessoas, de Jesus Cristo e da Sua Igreja? Na verdade, era Ele Quem estava a presidir à vossa festa.
• Amor humano. Todos compreendemos que amar é dar-se, elevando-nos acima da nossa natureza. O amor perfeito é o que se dá sem medida, sem esperar qualquer compensação; aquele que não guarda factura, nem recebido, para apresentar na primeira ocasião; é aquele que não negoceia com o coração, com os afectos; dá-se sem medida e sem quaisquer calculismos humanos.
O amor mais perfeito que encontramos na terra é o das mães. É um amor inesgotável, em generosidade crescente, que mantém sempre a esperança no triunfo de quem ama, que sofre com o sofrimento daquele que ama, que nunca desiste, mesmo quando não é correspondido.
Mas o amor da mãe não consegue libertar-se das limitações humanas. Ela projecta-se no filho e, de algum modo, procura nele o seu próprio triunfo.
O amor humano, quando vivido no matrimónio, é como o vinho. Se tem qualidade e está devidamente acondicionado, melhora com o passar dos anos. Se é de má qualidade — ou nem sequer existiu — torna-se uma bebida intragável.
• Amor divino e misericordioso. Só Deus é capaz de nos amar com perfeição infinita.
Nada procurou para Si em nós, porque nos amou antes de existirmos e foi por amor que nos chamou à vida, para nos tornar participantes da Sua felicidade, respeitando-nos sempre como pessoas livres e responsáveis.
Suporta as nossas indiferenças e até agressões, sempre à espera que O entendamos e nos rendamos à sua predilecção.
Por isso, o amor de Deus para connosco toma o nome especial e misericórdia, e todos somos chamados a imitá-lo uns para com os outros.
2. O nosso amor a Deus
Com Jesus e Maria. «Naquele tempo, realizou-se um casamento em Caná da Galileia e estava lá a Mãe de Jesus. Jesus e os seus discípulos foram também convidados para o casamento.»
Terá sido Maria Santíssima quem narrou a S. João Evangelista este acontecimento da vida pública de Jesus. Somente ele — que levou Maria para sua casa — refere este milagre do Divino Mestre. A nossa leitura do texto há ser feita tendo isto como referência.
• Amar servindo. Maria e José estão presentes nas Bodas por título diferente: Jesus é um dos convidados e Sua Mãe está também presente, talvez por que fosse da família e viesse ajudar nos trabalhos de confecção dos alimentos.
O facto de se ter apercebido de que o vinho se tinha acabado, deixando a família e os esposos num grande embaraço, permite-nos pensar que Maria estava situada no lugar de onde partia a comida e as bebidas, ou seja, no serviço domestico.
• Santificar os acontecimentos. Aprendemos com Jesus e Maria a santificar os acontecimentos dos nossos amigos. Comungar na alegria, na tristeza e nas preocupações é uma forma delicada de viver a caridade.
Somos incapazes de imaginar uma pessoa ou um casal isolados, a celebrar um grande acontecimento da sua vida. A alegria e o sofrimento vivem-se em comunhão.
Jesus dignifica este acontecimento com o Seu prestígio de Mestre; Maria, com as suas mãos privilegiadas que põem ao serviço e à alegria dos outros.
O cristão não pode ser um maniqueu que acha sempre o tempo perdido a participar num banquete, a passar uns bons momentos com os amigos, ou a fazer desporto.
Santa Teresa explica que, se a corda do arco estiver continuamente distendida, perde a sua força. Assim também não podemos viver continuamente com o ânimo tenso. As festas servem para nos ajudar a descansar um pouco o espírito, preparando-o para as lutas de cada dia.
• Atenção materna. Nada escapa ao olhar solícito das mães. Entendem um simples e discreto gesto, um rosto de preocupação disfarçada, alguma pequena falha que rapidamente procuram remediar.
São estes olhos maternos com que havemos de observar as pessoas; não com olhos críticos e de censura farisaica. Vale a pena perguntar: a descoberta de falhas no comportamento das outras pessoas dá-nos satisfação, porque talvez ajudem a valorizar, por contraste, o nosso comportamento.
Tudo isto que Jesus e Maria vivem nas Bodas de cana são outras tantas formas de viver a caridade, imitando o nosso Deus no Seu Amor.