A génese duma nova paróquia, em Faro
Nos finais da década de cinquenta escrevendo sobre a cidade de Faro, alguém afirmava:”Faro tem, nas últimas décadas, alargado consideravelmente a sua área urbana. Antigas hortas, algumas até existente dentro do próprio perímetro da cidade, nomeadamente as do colégio de S. Francisco, do Ferregial, do Carmo, do Ramos, do Pinto e do Nogueira, todo o vasto campo de S. Luis… deram, na sua quase totalidade, origem a bairros de linhas modernas, espaçosos e arejados em que se construíram centenas de edifícios de bom aspecto. (Grande Enciclopédia Portuguesa Brasileira, Editorial Enciclopédia, Limitada, Lisboa, Rio de Janeiro, volume XXXIX, Apêndice pág. 581, 1ª coluna).
E mais adiante: “Entre os principais edifícios públicos nos últimos anos construídos, merece salientar-se… o Mercado Público, construído num vasto e bem delineado largo que substitui os terrenos mais ou menos acidentados do campo de S. Luis”.
Não será, pois, necessário recuar muito no tempo para nos encontrarmos perante os terrenos mais ou menos acidentados do “vasto” Campo de S. Luis.
Entretanto, tudo isso pertence já ao passado e a área, outrora desabitada, converteu-se numa das zonas mais fortemente urbanizadas de Faro. Seguiu, afinal, a trajectória comum aos arredores de todas as cidades.
Esta transformação estrutural precisou de ser, naturalmente, acompanhada dum ensaio de resposta a nível pastoral, por parte da igreja diocesana.
Foi assim que, a ermida de S. Luis, outrora perdida no campo, (Ataíde de Oliveira diz, em 1904, que ficava a um quilómetro da cidade de Faro) com a festa anual em honra do Padroeiro como única expressão cultual, ao ser gradualmente absorvida pela cidade, se viu convertida, por força das circunstâncias, na igreja quase paroquial que, durante vários anos, foi chamada a ser.
Tudo isto se processou, entretanto, em sucessivas etapas que importa referir, sumariamente.
Não é suficientemente conhecida a importância pastoral que a capela terá ocupado ao longo dos tempos. Presume-se que o culto aí celebrado se circunscrevesse, até à segunda década do século XX, unicamente à festa anual, aliás muito concorrida e animada, em honra do Patrono, embora alguns documentos escritos pareçam querer atribuir-lhe um realce particular entre as demais capelas da cidade de Faro.
Assim, no “Dicionário de Portugal Antigo e Moderno” volume 3, Lisboa 1874, escreve-se na página 144, coluna II, ao falar-se de Faro. “Há também nesta cidade a bonita igreja de S. Luis e várias capelas”.
Não deixa de ser estranha e curiosa esta referência, pois não só se particulariza a especial beleza da capela de S. Luis, como se lhe atribui a designação da igreja, em confronto com outras, denominadas apenas capelas.
É, ainda, interessante verificar que, no dia primeiro de Dezembro de 1908, D. António Barbosa Leão, Bispo do Algarve, enviou ao pároco da Sé de Faro uma circular com uma infindável série de quesitos sobre os mais variados assuntos, a fim de que lhe fosse respondido até ao fim do mês. No número dez desses quesitos perguntava-se taxativamente: “Há capelas na freguesia? Quantas e que devoção têm? A que distância ficam da igreja paroquial? Estão em boas condições de asseio? Celebra-se nelas actos de culto? Alguma delas tem capacidade para ser igreja paroquial, no caso de ser preciso criar alguma nova paróquia?”
Não foi, infelizmente, localizado o texto de resposta a estes quesitos, mas não deixa de ser sintomática a última interrogação, tendente a obter uma resposta positiva e execução consentânea, cerca de setenta e cinco anos depois.
Entretanto, a vida pastoral mais ou menos regular começou a ter o seu incremento por volta de 1944, ainda que as actividades de catequese infantil fossem bastante anteriores.
No número seiscentos e doze da “Folha do Domingo”de 24 de Outubro de 1926 diz-se que “no domingo passado (17/10/1926) o Senhor Bispo visitou a catequese de S. Luiz, animando com a sua presença e exortações as crianças que a frequentavam”.
Daqui se depreende a existência duma catequese organizada, de forma a justificar a presença e a palavra do prelado da diocese.
Não se conhece exactamente a data em que tal catequese se terá iniciado, mas é de crer que tenha sido uma dezena de anos antes, data em que a sua regularidade é confirmada pelo facto de S. Luis figurar, a partir de então, como um dos centros de catequese da paróquia da Sé, ao lado doutros que existiam nas demais igrejas e capelas da cidade e arredores. “Folha do Domingo” apresenta, com os horários das celebrações dominicais, os locais e horários de catequese, mesmo das que, como S. Luis, não tinham ainda celebração habitual ao domingo.
Supõe-se que, além desta actividade, talvez apenas a festa anual em honra de S. Luis (ainda bem presente na memória dos mais idosos) tivesse lugar até à década de quarenta. A partir de então outras iniciativas terão sido lançadas.
As primeiras diligencias levadas a cabo visaram a angariação de fundos para a realização duma celebração dominical por mês, mas rapidamente se passou à celebração regular todos os domingos e dias de preceito, conforme se pode ler no relatório apresentado ao Bispo da diocese sobre as actividades de catequese referentes ao ano de 1944/1945, em que se afirma que “por iniciativa do pároco da Sé e a anuência do Senhor Bispo se vem de há tempos celebrando missa em todos os domingos e dias santos, com uma assistência que, vagarosamente, embora, vai crescendo sempre…”
Não se precisa há quanto tempo tal celebração se iniciou, mas presume-se que tenha sido durante o mês de Abril de 1944, pois o calendário das celebrações dominicais da cidade, transcrito em “Folha do Domingo”, começa a apresentar a celebração regular em S. Luis a partir dessa data. Sabe-se entretanto, que as tentativas começaram bastante tempo antes. É natural que, com a eucaristia dominical se tenha começado a celebrar também, esporadicamente, de semana, de modo que em meados da década de sessenta já se realizava uma celebração diária às 19h15, a cargo dos padres do Seminário, além de duas celebrações dominicais, às 9 e 10,30 horas, respectivamente. Como referência para o regular funcionamento desta celebração poder-se-à tomar o ano de 1955, já que é do dia 28 de Abril desse ano a licença que autoriza a conservação habitual do Santíssimo Sacramento na capela de S. Luis.
Em Outubro de 1969 o então bispo da diocese, D. Júlio Tavares Rebimbas nomeou para responsáveis/animadores da zona pastoral adstrita à capela de S. Luis, os padres Joaquim Beato e António Rocha.
Ao receberem o encargo de presidir aos destinos da comunidade cristã os sacerdotes deveriam ter em mente a eventualidade da formação duma futura paróquia, caso a caminhada a realizar o viesse a justificar.
No espaço “baldio” do espaldão estava previsto o local para a construção da futura igreja, ao lado doutros empreendimentos hoje de pé, ou em vias disso, como o hospital, pavilhão desportivo, etc.
Tratava-se duma zona em franco crescimento demográfico, pelo que vinha caído cada vez mais fora do centro paroquial, a igreja da Sé.
A população residente era muito diversificada, proveniente, em grande parte, das mais diversas zonas do país, abundando, particularmente, o sector do funcionalismo e serviços, as profissões liberais, militares em comissão população flutuante, em boa parte. Os naturais eram também em número apreciável.
Em meio tão diversificado fácil era, portanto, admitir a dificuldade de construir uma verdadeira comunidade cristã.
Foi neste ambiente que os sacerdotes foram convidados a trabalhar, animando toda a acção pastoral no campo da evangelização, litúrgica e serviços, com excepção das funções estritamente paroquiais que continuavam a cargo do pároco da Sé.
A primeira actividade a envolver os sacerdotes e a incipiente comunidade foi a da catequese infantil.
Também o restauro da capela, em situação precária, foi incentivo mobilizador, no ano de 1972, ainda que só concluído em 1974.
Neste ano o Pe. Beato deixou a comunidade e novo incremento se imprimiu à sua vida pastoral, com a criação de serviços, atribuição de responsabilidades e o ensaio de procedimentos inovadores, mais condizentes com os tempos de mudança então vividos e com a condição da comunidade quase paroquial, agora nascente.
Assim se foi caminhando ao longo dos anos, no meio de múltiplas vicissitudes e esperanças, sempre no desejo de melhor servir e na tentativa da maior fidelidade à mensagem cristã. Procurou-se construir tendo sempre a verdade como alicerce, o serviço como objectivo e a comunhão como rosto da Igreja.
Disto dá testemunho, na avaliação efectuada no termo de cada ano pastoral, o livro “S. Luis de Faro – A Génese daTerceira Paróquia da Cidade”,imprescindível para conhecer mais de perto e entender um pouco melhor o percurso efectuado por esta comunidade cristã.
Já a caminho de maior autonomia passaram a celebrar-se, a partir de 1978, baptismos e matrimónios, no seio da comunidade.
elevante expressão da dimensão sócio-caritativa da fé vivida e celebrada foi também a abertura, em 6 Dezembro de 1981, dum Centro de Tempos Livres para 120 crianças, em regime de ATL, provenientes, em especial, das faixas, social e economicamente mais desfavorecidas.
Como corolário da caminhada realizada passámos a ser, em 27 de Março de 1982, Domingo de Ramos, um Vicariato Paroquial (Paróquia Experimental), acontecimento que foi ampla e festivamente celebrado e participado.
Na condição de nova paróquia em fase experimental procurámos organizámo-nos de forma a correspondermos melhor, não só à situação da presente condição, mas no sentido de tentarmos ir mais longe na acção evangelizadora.
Entre as iniciativas lançadas para o efeito surge, em 1983, mais um órgão de comunicação – “ECOS do Vicariato Paroquial de S. Luis, publicado ao longo de mais de cinco anos e posteriormente seguido por outros, com vários modelos e nomes, assim como se iniciou a formação regular de adultos, “catequese” que ainda hoje vigora e que tem vindo a ser gradualmente implementada como resposta aos apelos feitos pela Igreja Diocesana, em ordem ao prosseguimento da acção evangelizadora em que está envolvida.
O crescimento comunitário urgiu que se pensasse num novo espaço de culto e de acção pastoral, cuja configuração começou a ser delineada em 1986 e se viu concluída em 21 de Junho de 1992, com a celebração de Dedicação da Igreja da Nova Paróquia de S. Luis, então definitivamente erecta.
Dispondo-se de novos espaços de culto e de acção pastoral, a vida comunitária sofre significativo incremento. Surge a Semana da Paróquia, anualmente celebrada no aniversário da dedicação da Nova Igreja, assim como a festa do Padroeiro no termo da mesma. A vida da paróquia passou a ser organizada em torno de planos, com objectivos, acções e calendário definidos no início de cada ano.
Estes planos substituíram, a partir de 1997, juntamente com os boletins regularmente publicados, toda a orientação pastoral que, desde de então, tem vindo a ser seguida.