14 de setembro de 2025 – Festa da Exaltação da Santa Cruz

Nicodemos é um fariseu bem-intencionado que procura a luz. Vai ter com Jesus, certa noite, porque intui que Jesus é um homem de Deus. Acha que Jesus pode guiá-lo em direção à luz, à vida verdadeira, à “salvação”. Por isso, Nicodemos está pessoalmente interessado em entender o projeto de Jesus, em mergulhar no mistério de Jesus. O que é – pergunta ele – que Jesus pretende com a pregação que anda a fazer pelas aldeias e vilas da Galileia? Qual é o seu objetivo?
Em resposta, Jesus expõe a Nicodemos o projeto que o Pai lhe confiou… Ele “desceu do céu”, por mandato de Deus, para vir ao encontro dos homens e para apontar aos homens os caminhos que conduzem à vida verdadeira (vers. 13). Por detrás dessa iniciativa de Deus, está o amor infinito que Ele sente pelos seus filhos que peregrinam na terra. Jesus irá dizer aos homens – com a sua vida, com as suas palavras, com os seus gestos – que Deus os ama com um amor sem igual; e irá convidá-los a acolherem esse amor e a deixarem-se conduzir pelo amor. Chegará até o dia em que Jesus, no exercício da sua missão, enfrentará os mecanismos de injustiça e de morte que destroem a vida, que geram infelicidade e sofrimento; chegará o dia em que Jesus oferecerá a sua vida até ao extremo, até ao dom total de si mesmo, para fazer nascer um mundo novo. Jesus será preso, condenado e levantado na cruz à vista de toda a Jerusalém, por causa da sua ação e do seu testemunho; e todos os que passarem pelo local da sua execução poderão contemplar, naquele homem que entregou a vida para salvar os seus irmãos, a grandeza incomensurável do amor de Deus. Os que olharem para o Crucificado, aprenderem a lição do amor e passarem a viver no amor, terão vida eterna. Serão pessoas renovadas, que se libertaram do egoísmo, da violência, da autossuficiência, da mentira, da maldade; serão homens e mulheres novos que, a exemplo de Jesus, optaram por viver no amor. O amor é sempre fonte de vida nova. Aqueles que o amor transformar estão destinados à comunhão plena com Deus.
Para que tudo isso seja mais claro para Nicodemos, Jesus recorre a um episódio da história de Israel (vers. 14). Durante a caminhada do povo pelo deserto, quando estavam perto do golfo da Aqaba, os israelitas murmuraram contra Deus e contra o seu servo Moisés. Estavam cansados, fartos de passar privações, até sentiam saudades do tempo em que eram escravos no Egito. Deus, para os educar, permitiu que eles fossem mordidos por serpentes venenosas. Os israelitas perceberam, então, o sem sentido das suas críticas à ação de Deus e mostraram-se arrependidos. Então Deus, na sua misericórdia, quis salvá-los. Ordenou a Moisés que construísse uma serpente de bronze e a colocasse no alto, sobre um poste; quem, depois de mordido por uma serpente venenosa, olhasse para a serpente de bronze exposta à vista de todos, seria salvo (cf. Nm 21,4-7). Como essa antiga serpente de bronze, Jesus será, para todos aqueles que o contemplarem, sinal visível do amor de Deus; como essa antiga serpente de bronze, Jesus será, para todos aqueles que o olharem e perceberem a lição do amor, fonte de vida eterna. Nicodemos pensava que a fonte da vida eterna estava na Lei, na Tora. Jesus garante-lhe que a vida plena não brota da Lei, mas sim do amor de Deus, expresso naquela cruz onde Jesus se oferece até ao dom total de si mesmo. Quem “acredita” no Homem levantado na cruz, quem adere a Ele e à sua proposta de Vida, quem aprende com Ele a fazer da própria vida dom total a Deus e aos irmãos, quem está disponível para dar a própria vida por amor, esse está destinado à Vida eterna (vers. 15).
Nesta altura, Nicodemos já percebeu que a presença de Jesus no mundo resulta do amor de Deus pelos seus filhos que caminham no mundo e na história; também já sabe que “acreditar” em Jesus, acolher as suas propostas, segui-l’O, viver ao seu estilo, amar como Ele ama, é fonte de vida eterna (“Deus amou tanto o mundo que entregou o seu Filho Unigénito, para que todo o homem que acredita n’Ele não pereça, mas tenha a vida eterna” – vers. 16). Nicodemos está agora preparado para entender que o desígnio de Deus sobre o homem não é um desígnio de condenação e de morte, mas é um desígnio de salvação e de vida. Jesus não veio julgar e condenar o mundo, mas sim salvá-lo (vers. 17). Ele veio oferecer aos homens – a todos os homens, sem exceção – a Vida definitiva. Jesus chegou ao mundo, dirigiu-se a homens pecadores, egoístas, autossuficientes, violentos, injustos, mentirosos, não para os condenar e ostracizar, mas para lhes oferecer a salvação. Mostrou-lhes o sem sentido da maldade e da injustiça e propôs-lhes uma vida diferente. Dando a vida por amor, inseriu os homens num dinamismo de vida nova, de vida plena. Jesus mostrou-nos, com o seu amor até ao extremo, como é que o mal pode ser vencido.
Sempre que olhamos para a cruz de Jesus, tomamos consciência de tudo isto; celebramos o amor de Deus e a salvação que esse amor nos veio oferecer; comprometemo-nos a seguir os passos de Jesus e a construir um mundo onde o amor esteja presente; tomamos consciência de que somos enviados a dar testemunho do amor de Deus – desse amor que aprendemos com Jesus – junto dos nossos irmãos, particularmente os mais sofredores, os mais abandonados, os mais esquecidos.

INTERPELAÇÕES
• João é o evangelista abismado na contemplação do amor de um Deus que não hesitou em enviar ao mundo o seu Filho, o seu único Filho, para apresentar aos homens uma proposta de felicidade plena, de vida definitiva; e Jesus, o Filho, cumprindo o mandato do Pai, fez da sua vida um dom, até à morte na cruz, para mostrar aos homens o “caminho” da vida eterna… O Evangelho que escutamos na Festa da Exaltação da Santa Cruz convida-nos a contemplar, com João, esta incrível história de amor e a espantar-nos com o peso que nós – seres limitados e finitos, pequenos grãos de pó na imensidão das galáxias – adquirimos nos esquemas, nos projetos e no coração de Deus. Temos consciência desse amor, estamos gratos por esse amor, aceitamos que esse amor nos indique o caminho que devemos percorrer e a forma como devemos viver?

• O amor de Deus traduz-se na oferta ao homem de Vida plena e definitiva. É uma oferta gratuita, incondicional, absoluta, válida para sempre e que não discrimina ninguém. Aos homens – dotados de liberdade e de capacidade de opção – compete decidir se aceitam ou se rejeitam o dom de Deus. Às vezes, os homens acusam Deus pelas guerras, pelas injustiças, pelas arbitrariedades que trazem sofrimento e que pintam as paredes do mundo com a cor do desespero… Mas o texto evangélico que hoje escutamos é claro: Deus ama cada pessoa e a todos oferece a vida. O sofrimento e a morte não vêm de Deus, mas são o resultado das escolhas erradas feitas pelo ser humano que se obstina na autossuficiência e que prescinde dos dons de Deus. Temos consciência de que alguns dos males do nosso mundo poderão resultar do nosso egoísmo, do nosso orgulho, do nosso comodismo, dos nossos preconceitos, da nossa recusa em ouvir Deus e em seguir os caminhos que Ele nos aponta? O que é que precisamos de mudar, nas nossas vidas, para sermos sinais e arautos do amor de Deus?

• O evangelista João define claramente o caminho que todo o homem deve seguir para chegar à vida eterna: trata-se de “acreditar” em Jesus. “Acreditar” em Jesus não é uma mera adesão intelectual ou teórica a certas verdades da fé; mas é escutar Jesus, acolher a sua mensagem e os seus valores, segui-l’O no caminho do amor e da entrega ao Pai e aos irmãos. “Acreditar” significa olhar para aquele homem levantado na cruz e aprender com Ele o amor até ao extremo, o amor que ultrapassa todo o egoísmo e é dom total; “acreditar” passa por despir o egoísmo, o orgulho, a autossuficiência, os preconceitos, para realizar gestos concretos de dom, de entrega, de serviço que tragam alegria, vida e esperança aos irmãos que caminham lado a lado connosco. A liturgia da Festa da Exaltação da Santa Cruz convida-nos a percorrer, com Jesus, esse caminho de amor, de dom, de entrega total que Ele percorreu. Jesus é para nós essa referência fundamental, que procuramos seguir a cada instante e que nos aponta o caminho? Estamos dispostos a confiar incondicionalmente n’Ele, mesmo quando as suas indicações parecem estar contra a cultura ambiente, os ditames da moda, as doutrinas vigentes, ou as regras do socialmente correto?

• Contemplar a cruz onde se manifesta o amor e a entrega de Jesus significa assumir a mesma atitude que Ele assumiu e solidarizar-se com aqueles que são crucificados neste mundo: os que sofrem violência, os que são explorados, os que são excluídos, os que são privados de direitos e de dignidade. Olhar a cruz de Jesus significa denunciar tudo o que gera ódio, divisão, medo, em termos de estruturas, valores, práticas, ideologias; significa evitar que os homens continuem a crucificar outros homens; significa aprender com Jesus a entregar a vida por amor… Viver deste modo pode conduzir à morte; mas o cristão sabe que amar como Jesus é viver a partir de uma dinâmica que a morte não pode vencer: o amor gera vida nova e introduz na nossa carne os dinamismos da ressurreição. A contemplação da cruz de Jesus leva-nos ao compromisso com a transformação do mundo? A contemplação da cruz de Jesus faz com que nos sintamos solidários com todos os nossos irmãos que todos os dias são crucificados e injustiçados? A contemplação da cruz de Jesus dá-nos a coragem para lutarmos contra tudo aquilo que gera sofrimento e morte, mesmo que isso implique correr riscos, ser incompreendido e condenado?

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