6 de outubro de 2024 – 27º Domingo do Tempo Comum – Ano B

É surpreendente que os fariseus dirijam a Jesus a pergunta: «Pode um homem repudiar a sua mulher?» Como todos os outros israelitas, sem exceção, também os membros desta seita não tinham dúvidas acerca da licitude do divórcio, na medida em que o Antigo Testamento contemplava a possibilidade de um segundo matrimónio. A questão punha-se mais nos motivos que o podiam justificar.

O tema da indissolubilidade é introduzido por Marcos na parte central do seu Evangelho, juntamente com outras questões morais como o diálogo com quem não acredita, a caridade para com os irmãos, o escândalo, o relacionamento com os mais fracos, a propriedade, as riquezas. É colocado neste contexto porque a existência de fidelidade conjugal absoluta e incondicional é assustadora e desconcertante, e não pode ser entendida se não se enquadra na lógica do amor de Cristo e do dom da vida.

Respondendo à pergunta que lhe foi dirigida, Jesus esclarece, antes de mais, o verdadeiro significado da lei de Moisés, lei que Ele não pretende abolir, mas explicar e levar à sua plena realização.

O livro do Deuteronómio parece permitir o divórcio: «Quando um homem tomar uma mulher e a desposar, se depois ela deixar de lhe agradar, por ter descoberto nela algo de vergonhoso, escrever-lhe-á um documento de divórcio, entregar-lho-á na mão e despedi-la-á de sua casa». Alguns rabis, os mais severos, ensinavam que o marido só podia repudiar a sua esposa no caso de esta lhe ter sido infiel; mas outros, mais tolerantes e permissivos, defendiam que para a repudiar bastava que a esposa tivesse preparado mal o jantar ou que o marido tivesse encontrado outra mais atraente.

Antes de se pronunciar sobre o tema, Jesus esclarece o significado do texto bíblico. Não foi Moisés – explica Ele – quem introduziu o divórcio. Esta instituição existia muito antes dele, e sempre fora aceite como legítima; ele procurou apenas discipliná-la, pondo um limite aos abusos. Não pretendeu dos Israelitas, ainda com um coração demasiado endurecido, um comportamento moral superior aos outros povos; limitou-se a ditar uma norma que protege a mulher. Determinou que o marido lhe entregasse o documento de divórcio de modo que ela pudesse voltar a casar.

Esta disposição era muito oportuna, porque muitos expulsavam de casa a própria mulher e tomavam outra; se a primeira se juntava com outro homem, acusavam-na de adultério, uma culpa que implicava a pena de morte. O preceito de Moisés tinha como finalidade defender a mulher deste abuso: o documento de divórcio declarava-a livre.

Com Jesus, o reino de Deus chegou ao mundo, cumpriram-se as profecias, foi dado a cada pessoa «um coração novo e um espírito novo», arrancado «o coração de pedra e dado um coração de carne». Com Ele chegou o momento de dizer «basta» aos acordos mesquinhos, aos subterfúgios, e de corresponder ao ideal indicado «no princípio» pelo Criador.

Só o matrimónio monogâmico e indissolúvel é que respeita o projeto de Deus e alcança o objetivo para o qual o ser humano foi criado como «homem e mulher». Todas as outras formas de convivência, mesmo se muito antigas e culturalmente explicáveis, não respeitam a dignidade do homem e da mulher.

Perante a posição dura e intransigente do Mestre, não só os fariseus mas também os discípulos ficam perplexos, quase assombrados, e de regresso a casa interrogam-no de novo sobre o assunto. Mas Jesus reafirma: «Quem repudiar a sua mulher e casar com outra comete adultério contra a primeira», e acrescenta: «E se a mulher repudiar o seu marido e casar com outro, comete adultério». Esta afirmação estabelece – coisa inaudita até àquele momento – a perfeita paridade de direitos e deveres do homem e da mulher.

Como interpretá-la?

Cristo não impôs uma nova lei, mais rigorosa do que a de Moisés, mas lembrou o projeto originário de Deus que não contempla o repúdio.

A meta é muito alta, mas os passos do ser humano são muitas vezes incertos. Como só Deus conhece a fragilidade de cada pessoa, ninguém se pode levantar como juiz dos seus próprios irmãos, ninguém tem o direito de avaliar as suas culpas e pronunciar uma condenação. É necessário ir ao encontro das situações concretas com prudência, e cada irmão deve ser entendido, acompanhado e ajudado de modo que possa dar o melhor de si mesmo.

Mostrar compreensão e paciência não significa diluir as exigências evangélicas ou adequar-se à moral corrente, mas mostrar sabedoria pastoral.

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