3 de abril de 2022 – 5º Domingo da Quaresma – Ano C

Hoje, numa espécie de parábola ao vivo, Jesus desafia-nos ao perdão, em vez da fria crueza da nossa condenação! Eis, portanto, três palavras, três atitudes, para uma quaresma de compaixão: conversão, misericórdia, perdão. Vamos, primeiramente, ouvir a Palavra de Deus e depois iremos também nós pedir a Deus, que transforme as pedras do coração em mãos abertas para o perdão!

  1. «Não presteis atenção às coisas antigas. Vou realizar uma coisa nova» (Is 43, 18-19)

Há uma frase na primeira leitura que nos traz a mensagem principal da Palavra de Deus para este Domingo. O profeta Isaías vai anunciar ao povo eleito, que vivia preso no cativeiro, que Deus irá conduzi-los com solicitude e amor para a liberdade. E é neste contexto que o profeta diz: «Não vos lembreis mais dos acontecimentos passados, não presteis atenção às coisas antigas. Olhai: vou realizar uma coisa nova» (Is 43, 18-19)

Nestas palavras se resume aquilo que Deus hoje nos quer dizer. Neste tempo da Quaresma, somos convidados a pôr do lado o passado, a esquecer o nosso pecado e, fazendo a experiência do perdão de Deus nas nossas vidas, deixar que o Senhor realize coisas novas em cada um de nós.

Dizem-nos claramente os textos bíblicos de hoje que, na perspectiva de Deus, não são o castigo e a intolerância que resolvem o problema do mal e do pecado; só o amor e a misericórdia geram activamente vida e fazem nascer o homem novo. É esta lógica – a lógica de Deus – que somos convidados a assumir na nossa relação com os irmãos

 

  1. Em vez da pedra o perdão.

Mas voltemos ao Evangelho para que possamos perceber bem a força desta mensagem. E se na semana passada ouvíamos Cristo a ensinar-nos acerca da misericórdia de Deus, contando-nos a parábola do filho pródigo, hoje Ele vai muito mais longe porque nos falará desse perdão misericordioso já não com belas histórias e palavras encantadoras, mas com gestos e com a sua própria vida.

Escribas e fariseus queriam sepultar a pecadora com a pedra de um passado de pecado. Um coração tão duro como a pedra. Um olhar tão sujo como o chão. As mãos tão apertadas como a Lei. E com a pedra da cegueira, escribas e fariseus queriam atingir de um só tiro a autoridade do Mestre e a dignidade de uma Mulher.

Jesus escreve no chão e coloca sobre o passado a pedra de uma ruína, a vida de uma Mulher, com direito a reconstrução. Eles armam-se com a certeza das suas públicas virtudes. Jesus desarma-os com a verdade dos seus vícios privados. E caem uma e outra pedra… E ficou só Jesus e a mulher. A mísera e a misericórdia. Em vez da pedra o perdão.

E que coisa é este «perdão»? Um simples cancelar da culpa? Não. Uma pura suspensão do castigo? Também não! A indiferença diante do pecador? Muito menos ainda. Bem diferente disso, o perdão é um acto de «criação», de «nova geração». Perdoando, Deus esquece os acontecimentos do passado, deixa de prestar atenção às coisas antigas, para abrir um «caminho novo», para fazer do homem pecador uma «nova criatura». O perdão de Deus recria e regenera o homem na sua condição. Transforma-o por dentro, fá-lo um «outro ser». Por isso, o perdão não é um sentimento, uma emoção. Mas uma decisão, um acto criador. Perdoar é acolher a existência do outro, não porque esteja bem como está, mas para a fazer renascer para a sua verdade, para a recriar no amor.

 

  1. «Esquecer o que fica para trás, lançar-me para a frente» (Jo 16, 33).

No nosso mundo, o fundamentalismo e a intransigência falam frequentemente mais alto do que o amor: mata-se, oprime-se, escraviza-se em nome de Deus; desacredita-se, calunia-se, em razão de preconceitos; marginaliza-se em nome da moral e dos bons costumes… Esta lógica (bem longe da misericórdia e do amor de Deus) leva-nos a algum lado? A intolerância alguma vez gerou alguma coisa além de violência, de morte, de lágrimas, de sofrimento?

Quantas vezes nas nossas comunidades cristãs a absolutização da lei causa marginalização e sofrimento… Quantas vezes se atiram pedras aos outros, esquecendo os nossos próprios telhados de vidro… Quantas vezes marcamos os outros com o estigma da culpa e queimamos a pessoa em “julgamentos sumários” sem direito a defesa… É esta a lógica de Deus? O que nos interessa: a libertação do nosso irmão, ou o seu afundamento?

De resto, «águas passadas não movem moinhos». Porque, no dizer de S. Paulo, um passado de luxo não é mais do que um puro monte de lixo! E, ao olhar de Deus, é até possível abrir num passado de luxúria, um caudal de águas puras!

Acima de tudo, hoje é-nos dito que Deus não amarra homem algum ao seu passado nem ao seu fracasso. Deus não olha ao que nós fomos. Olha para quem somos. Ama-nos e por isso nos perdoa e, com o seu perdão, nos liberta da culpa e nos dá alma nova para um novo recomeço.

Paulo fez experimentou este Deus e por isso pôde dizer: «Só penso numa coisa – dizia o Apóstolo – esquecendo o que fica para trás, lançar-me para a frente, continuar a correr para a meta, em vista do prémio a que Deus, lá no alto, me chama em Cristo Jesus». «Para mim viver é Cristo e o resto é lixo!!» (Jo 16, 33).

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