Guardavam-nos em seu coração
S.Lucas diz, no princípio do seu evangelho, que se informou cuidadosamente dos acontecimentos que ia contar. Foi com certeza da boca de Nossa Senhora que ouviu o relato que hoje escutámos. Ela estava presente e guardava no Seu coração e meditava estes feitos maravilhosos de Deus, que vinha salvar o Seu povo.
Tinha sido Ela três meses antes que tinha trazido Jesus àquela casa e assistido ao prodígio daquele menino que saltava de alegria no seio materno, sentindo a presença do Salvador.
Aquele menino foi santificado ainda antes de nascer e preparado com graças extraordinárias para a missão de precursor do Messias.
Maria, melhor que ninguém, ia captando essas maravilhas de Deus. A mão do Senhor estava com aquele menino. Ela foi como que a madrinha de S.João Baptista. Trouxe-lhe Jesus. Esteve a ajudar a sua mãe durante três meses. Cuidou dele quando nasceu. Assistiu à cena que há pouco escutámos. A língua de Zacarias, que estava mudo há muitos meses por ter duvidado, soltou-se miraculosamente, louvando a Deus por aquele menino e falando da missão, que o anjo tinha anunciado.
Ao recordar hoje, cheios de alegria, o nascimento do Precursor, louvemos a Deus que faz maravilhas nos Seus santos. Eles são a Sua obra prima. Mais que a grandeza do universo que nos rodeia. Mais que a beleza das flores, das plantas e dos animais, que nos encantam.
Deus fez maravilhas em S.João Baptista e nos santos de todos os tempos. Também naqueles que a Igreja vai canonizando em nossos dias. Eles são a manifestação da santidade, da graça e do poder de Deus.
S.João Paulo II e, agora, o papa Francisco lembraram-nos repetidas vezes que Deus nos chama a todos à santidade. É para isso que estamos no mundo. Não para comer e beber e nos divertirmos, como se fôssemos apenas animais.
Ser santo é ser feliz. A igreja recorda com alegria em cada ano os seus santos. E o povo, mesmo não cristão, aproveita os santos populares para manifestações de alegria. Como que a dizer que a santidade é fonte da verdadeira felicidade já neste mundo.
Mesmo sofrendo, permanece sempre a alegria de filho de Deus. Por volta de 1931, S. Josemaria, estava a passar por sofrimentos muito grandes. Em Madrid queimavam-se igrejas e perseguiam-se os sacerdotes. Ele começava a ser alvo de calúnias e incompreensões. E, no eléctrico, o Senhor fez-lhe ouvir claramente no íntimo da alma: -Não és tu meu filho?
Contava ele, mais tarde, que, sem se poder reprimir, ia repetindo pelas ruas, cheio de alegria, quase como louco, as palavras de S.Paulo: Abbá, Pai.
Cansei-me inutilmente
O profeta põe na boca de João Baptista este queixume de aparente desânimo: cansei-me inutilmente. Aos olhos dos homens, a vida de S.João foi um desastre. Acabou com a cabeça cortada por Herodes. Mas não. Celebramos hoje com alegria a sua festa, passados dois mil anos. Valeu a pena a sua vida. Valeu a pena a sua morte ao serviço da verdade, ao serviço de Cristo.
Podemos sentir a tentação do desânimo. Tentamos uma vez e outra e parece que não acabamos de corrigir os nossos defeitos. Fazemos propósitos, às vezes grandiosos, de amar a Deus, de servir os outros. E talvez no dia seguinte fazemos exactamente o contrário. Apetece-nos ficar caídos no chão depois de termos fracassado.
É preciso reagir. A santidade é fruto da graça de Deus. Temos de contar mais com o Espírito Santo, colaborar mais docilmente. Podemos aproveitar as nossas faltas e os nossos fracassos para crescer em humildade, que é virtude fundamental da santidade.
Celebrar as festas dos santos é algo de exigente e difícil. Trata-se não de comer e beber e divertir-se à sua custa, como pretendem alguns. Mas de nos animarmos a parecer-nos com eles. Começando por nos converter, pedindo perdão dos nossos pecados. As festas dos santos podem medir-se pelo número de confissões. Pelo sacramento do perdão passa a mudança interior de cada um de nós. Pelo confessionário passa o desejo firme de renovação interior, passam os propósitos de santidade.
O Espírito actua nas almas sobretudo no sacramento da reconciliação. Recebei o Espírito Santo. Àqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados. (Jo 20,23).
S.João Baptista está de modo particular relacionado com este convite à conversão, na base do caminho da santidade. Celebrar a festa de S.João Baptista de verdade é ouvir este apelo de Deus a que nos convertamos a Ele cada dia, com nova esperança, com nova decisão de O amarmos nos afazeres diários. No lugar onde Deus nos colocou. Esse é o caminho da santidade.
E é o caminho da alegria, dessa alegria que muitos ainda hoje, sem dar conta, ligam com os santos.
Vale a pena levar essa mensagem a toda a parte. Purificar as festas dos santos daquilo que pode afastar de Deus, daquilo que acaba por roubar a alegria do coração do homem. Os santos descobriram o segredo da alegria verdadeira já neste mundo. E o caminho para ela não é fácil, exige sacrifício, luta de todos os dias. Mas está ao alcance de todos.
Vale a pena celebrar as festas dos santos. Eles não roubam a Deus a glória que só a Ele pertence. Pelo contrário, eles animam-nos a amar a Deus cada dia mais em nosso trabalho, na família, nos divertimentos, na vida social.
Os santos foram, ao longo da história humana, os grandes revolucionários, os que de facto contribuíram para transformar o mundo e para o tornar mais humano.
Não sou digno
S.João Baptista aparece no Evangelho como modelo de fé e de humildade. Ele “o maior entre os nascidos de mulher “como Jesus afirmou, não se julgava digno de desatar a correia das sandálias do Messias.
Ensina-nos a tratar a Jesus, a adorá-Lo na Eucaristia, a acolhê-Lo na sagrada comunhão. Temos de redescobrir este respeito diante de Jesus. Hoje as nossas igrejas parecem mais um espaço profano. pela maneira como muitos se comportam. Os casamentos assemelham-se a uma feira. E o mesmo pode acontecer em baptizados, velórios, ensaios de grupos corais. Muitas pessoas que andam na igreja perderam já o sentido desta presença do Senhor, que, sendo nosso amigo, não deixa de ser o nosso Deus e merecer o nosso respeito e adoração.
É conhecido o caso do Seminário de Viseu, transformado em quartel pelos republicanos em 1910. A igreja foi destinada a cocheira de peças de artilharia. Tentaram uma e outra vez que as mulas as levassem lá para dentro, mas os animais nem a bem nem a mal lá entraram. Muitas vezes os irracionais dão lições aos humanos.
Os sacerdotes têm de chamar a atenção para este respeito na casa de Deus, mesmo que alguns não gostem. E não só os padres. Todos os cristãos têm de zelar pela casa de Deus, sejam igrejas ou capelas.
Jesus expulsou os vendilhões do templo, que no adro vendiam e compravam as coisas para o serviço do culto. E disse-lhes “está escrito a minha casa é casa de oração e vós fizestes dela covil de ladrões” (Lc 19,46)
A casa de Deus é lugar de silêncio, de oração. Não é para conversar nem estúdio para fotografias. Não é preciso fé para saber respeitá-la. Basta um pouco de educação. Se entrássemos no palácio da Rainha de Inglaterra não iríamos para lá fazer algazarra.
Temos de lutar para recuperar este respeito pela presença de Jesus na Eucaristia. Tratá-Lo bem, a Ele que é verdadeiro Deus e verdadeiro homem. “Se actualmente o Cristianismo se deve caracterizar sobretudo pela arte da oração – dizia João Paulo II – como não sentir de novo a necessidade de permanecer longamente, em diálogo espiritual, adoração silenciosa, atitude de amor, diante de Cristo presente no Santíssimo Sacramento? Quantas vezes – confessava o papa – meus queridos irmãos e irmãs, fiz esta experiência, recebendo dela força, consolação e apoio” (A Igreja vive da Eucaristia, 25)
Que S.João Baptista nos ensine esta boa educação da piedade. E também Nossa Senhora que lhe levou Jesus.