A fé não é um hábito

Não se pode ser cristão «pela metade», deixando Jesus entre as paredes da Igreja e evitando testemunhar a própria fé «na família, na educação dos filhos, na escola, no bairro». Contra esta «hipocrisia dos justos» o Papa Francisco advertiu na missa.

A meditação do Pontífice inspirou-se no trecho evangélico de Lucas (10, 13-16) proposto pela liturgia, no qual Jesus «repreende três cidades — Betsaida, Corazin, Cafarnaum — porque não ouviram a sua palavra. Só escutaram, mas aquela palavra não entrou no seu coração, pois não acreditaram nos sinais, nos milagres que fez». A admoestação do Senhor é explícita: «Mas se em cidades pagãs como Tiro e Sidom, eu tivesse feito estes milagres, certamente teriam acreditado. Mas vós não».

Francisco observou que Jesus «parece estar zangado». E recordou que imediatamente a seguir, no mesmo evangelho, ele «fala da conversão, com a pregação do profeta Jonas: “E vós, não vos converteis?”». Trata-se, frisou, de «uma repreensão severa de Jesus a estas cidades, a estes povos que, tendo-o ali, vendo os seus prodígios, continuam na lógica do “Sim, mas… Nunca se sabe”, e não dão o passo de o reconhecer como Messias».

Por detrás «desta repreensão — constatou o Papa — há um pranto», porque Jesus «está entristecido por ser rejeitado, por não ser recebido». O Senhor «gosta deste povo, mas sente-se consternado». Portanto «por detrás da reprovação está o pranto de Jesus», reafirmou Francisco, recordando quando o Senhor «da montanha viu Jerusalém distante, e chorou». Com efeito, «Jesus queria chegar a todos os corações, com uma mensagem que não era ditatorial, mas de amor. E Jesus chorou, porque esta gente não foi capaz de amar».

A este ponto o Pontífice, atualizando a sua reflexão, propôs que no lugar das «personagens deste acontecimento: em vez de Corazin, Betsaida e Cafarnaum — estas três cidades — nos ponhamos nós, eu que recebi tanto do Senhor. Cada um de nós». Por isso convidou a fazer um exame de consciência: «Cada um pense na própria vida. O que recebi do Senhor. Nasci numa sociedade cristã, conheci Jesus Cristo, conheci a salvação, fui educado, educada na fé. E com quanta facilidade me esqueço, e deixo passar Jesus». Uma atitude que contrasta com aquela de «outras pessoas que ouvem o anúncio de Jesus, imediatamente se convertem e o seguem». Ao contrário, reconheceu o Papa, «nós estamos “habituados”». E «este hábito faz-nos mal, porque reduzimos o Evangelho a um facto social, sociológico, e não a uma relação pessoal com Jesus».

Na realidade, prosseguiu Francisco, «Jesus fala a mim, a ti, a cada um de nós. O apelo de Jesus é para cada um de nós». E então surge a vontade de se questionar: «Porque vão ter com Jesus aqueles pagãos logo que ouvem a sua pregação e eu, que nasci aqui, numa sociedade cristã, para mim o cristianismo é como se fosse um hábito social, uma roupa que visto e depois abandono?». É por isso que «Jesus chora por cada um de nós quando vivemos o cristianismo formal e não realmente».

Deste modo, insistiu o Papa, «somos um pouco hipócritas». É «a hipocrisia dos justos». Com efeito, há «a hipocrisia dos pecadores, mas a hipocrisia dos justos é o receio do amor de Jesus, o medo de se deixar amar». Em síntese, observou o Pontífice, «quando fazemos isto, procuramos gerir nós a relação com Jesus». É como se lhe disséssemos: «Sim. Vou à missa mas tu fica na Igreja que eu depois volto para casa». Por conseguinte, frisou, «Jesus não volta para casa connosco: para a família, a educação dos filhos, a escola, o bairro… Não, Jesus fica lá. Ou permanece no crucifixo ou na pequena imagem, mas aqui».

Ao concluir, o Papa renovou aos fiéis a proposta de «um dia de exame de consciência», recomendando-lhes como “refrão” espiritual as palavras dirigidas pelo Senhor às cidades que não seguiam os seus ensinamentos: «“Ai de ti”, porque te concedi tanto, dei-me a mim mesmo, escolhi-te para seres cristão, cristã, e tu preferes uma vida pela metade, uma vida superficial: um pouco de cristianismo e água benta mas nada mais». Na realidade, explicou, «quando se vive esta hipocrisia cristã, o que nós fazemos é afastar Jesus do nosso coração. Fazemos de conta que o temos connosco, mas afastamo-lo. Somos cristãos, orgulhosos de ser cristãos, mas vivemos como pagãos».

«Cada um de nós pense: “Sou Corazin? Sou Betsaida? Sou Cafarnaum?”» foi a exortação de Francisco. Convidando a que, «se Jesus chora», a «pedir a graça de chorarmos também nós: “Mas, Senhor, tu deste-me tanto. O meu coração está tão duro que não te deixa entrar. Senhor, pequei de ingratidão, sou um ingrato, uma ingrata”». Seja «esta a oração de hoje. E abramos o coração, e peçamos ao Espírito Santo que nos escancare as portas do coração, para que Jesus possa entrar, a fim de que não só ouçamos Jesus, mas ouçamos e recebamos a sua mensagem de salvação e demos graças por tantas coisas boas que fez por cada um de nós».

 

Fonte: http://www.vatican.va/

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