Que palavra tem o direito de esperar do cristão quem vive dramas pessoais e familiares uns atrás dos outros? Epidemias, terramotos e ciclones que atingem zonas do mundo já devastadas pela fome e pela miséria são situações que colocam sérias interrogações ao crente. As guerras, as violências, as injustiças, as traições devem – sem dúvida – ser atribuídas ao ser humano, porém, porque é ele assim tão mau? Deus não podia tê-lo feito melhor?
No passado, resolvia-se o problema do mal descarregando as culpas no diabo, nas leis naturais ou recorrendo à fórmula mágica: Deus não quer, mas permite. Mas, se o Senhor pode intervir na história do homem, então porque não o faz?
O enigma do mal não pode ser explicado com raciocínios, senão Jesus teria esclarecido a questão. Um dia, quando a história do mundo chegar à sua conclusão, entenderemos o sentido; mas agora, a resposta de Deus às acusações que temos o direito de lhe dirigir, gritando com os Apóstolos: «Não te importas que pereçamos?, é uma só e é a mais inesperada. Ele não se pôs a discorrer sobre o assunto, mas subiu para o nosso barco; sacudido pela tempestade, juntamente connosco está também Ele. Experimentou a pobreza com os pobres, a rejeição e a marginalização com os excluídos: com os desiludidos partilhou a incompreensão e as lágrimas, com os atraiçoados a amargura da solidão e do abandono; juntamente com os oprimidos suportou a injustiça, e com os condenados à morte experimentou o pavor e o medo.
E, no entanto, fica a impressão de que Ele dorme. Com o nosso grito, que é a oração, queremos acordá-lo e obriga-lo a intervir. Mas Ele já está acordado, só que tem uma visão diferente do perigo e do modo de o enfrentar, e pede uma confiança ilimitada. Somos, sem dúvida, sacudidos pelas ondas do mar; mas também, sem que nos dêmos conta, somos acompanhados por Ele.
Em certos momentos, os cristãos podem sentir-se sozinhos perante os problemas, as adversidades e os fracassos, e perguntarem-se: «Onde está Deus? Onde está Cristo? Porque não manifestou o seu poder?» Sentem que está longe, ou até mesmo ausente; o seu silêncio desconcerta-os, deixa-os com medo. Quereriam gritar-lhe como o salmista: «Desperta. Senhor, porque dormes?»
O equívoco nasce do facto de que se gostaria de ter à disposição um Deus que intervém, um Deus às ordens, que altera as relações de força que existem no mundo, que se alia com quem sofre a injustiça de modo a derrotar e humilhar quem comete.
Jesus revela-nos um Deus que «dorme», que deixa as coisas como estão, que não tem nada a temer perante o desencadear da violência do mal, que não receia perder o controlo da situação. É um Deus que deixa fazer, permite o desencadear das invejas, das rivalidades, das mentiras e das injustiças, deixa que os acontecimentos tenham o seu decurso. Depois, quando o mal parece ter dito a última palavra, descobre as cartas e mostra que venceu Ele. Serviu-se das próprias forças do mal para acionar o seu projeto de salvação e de amor. Nós gritamos-lhe para arrastá-lo nas nossas angústias, Ele responde introduzindo-nos na sua paz.
É nesta ótica que tem uma explicação a chamada de atenção de Jesus aos discípulos. Eles tinham cometido o erro de só se lembrarem dele numa situação desesperada. Quem tem fé vive num diálogo constante com Cristo e com a sua palavra, não o chama apenas quando as coisas correm mal.