Um coração à janela

Eram umas jornadas da pastoral familiar, aparentemente como quaisquer outras; partilhando, porventura, muitos dos participantes com as edições anteriores e repetindo mesmo algum palestrante de há anos atrás.

Hoje tenho alguma dificuldade em recordar o tema genérico do encontro; mas de uma coisa me lembro claramente: à entrada do grande salão havia um painel com muitas frases afixadas e alguns cartazes artesanalmente desenhados. Foi um destes que me chamou a atenção e se gravou, como mensagem maior, na minha memória: mostrava uma rua de casas alinhadas, aparentemente muito semelhantes. No entanto, uma era distintiva: a uma das janelas assomava um coração!…

Olhei e voltei a olhar, assimilando a afirmação de um amor que se mostrava àquele parapeito; um amor que não se continha nas expressões dentro de quatro paredes, mas se apresentava ali, rosado e descontraído, testemunhando, a quem passava, uma alegria incapaz de se esconder.

Passados anos, acompanha-me esta imagem – que sempre recordo cada vez que desejo retirar da clandestinidade e do falso pudor uma vida de compromisso que tem de mostrar-se, sob pena de se negar.

Este meu texto apressado é, por isso, um pedido sentido às famílias cristãs: sem angelismos que negam problemas ou dificuldades, ponde o vosso amor à janela e deixai que se veja a alegria de amar e ser amado; mostrai a vossa beleza e testemunhai o alegre trabalho de constantemente aprofundar uma relação que também cresce ao revelar-se.

Esta humilde visibilidade pode ter, para muitas situações de sofrimento, o valor de um farol — que não é brilho orgulhoso, mas luz de misericórdia: não visa denunciar as agruras de quem ostenta dificuldades no caminho, mas acolher sofrimentos e dizer a quem procura que há possibilidades que a cultura vigente parece sistematicamente negar

O encontro mundial de Filadélfia vai repetir, nos próximos dias, que o amor é a missão da família. Pois, que se veja, que se veja!… Que se veja na fortaleza de o conservar, revelar e comunicar. Que se veja nas lições de humanidade que oferece.

Que se veja. Porque as famílias cristãs não podem habitar um condomínio fechado ou inscrever-se numa espécie de “confraria dos ausentes”, para usar a expressão do cardeal Cañizares, a respeito do silêncio dos crentes no mundo. Seria atrofiar-se na autorreferência em vez de ser berço da sociedade.

“Património da humanidade”, como lhe chamou Bento XVI, se a família naufraga, afoga-se o homem!.. Por isso, as famílias – e a fortiori as famílias cristãs – têm de estar conscientes da sua dimensão social e assumi-la com um protagonismo ativo. Os conteúdos e modos da sua ação social são, entre outros, o amor, a vida e a educação.

A caminho de Filadélfia, falando às famílias na catedral de Nossa Senhora da Assunção, em Cuba, o papa Francisco mostrou o melhor legado que se pode deixar para um mundo melhor: “Deixemos um mundo com famílias” – pediu.

João Aguiar Campos,

Secretariado Nacional das Comunicações Sociais

Fonte: www.ecclesia.pt

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